Eletromobilidade

DT na BusWorld: Hidrogênio e ônibus elétricos de pequeno porte, o que o Brasil precisa estar atento

Local: BusWorld Europa (Bélgica)

Nas células de combustível está uma das esperanças do setor de transporte quanto a autonomia; Já nos pequenos, a questão a ser resolvida é a vantajosidade econômica

ADAMO BAZANI

Duas necessidades brasileiras quanto a eletrificação de frotas brasileiras de ônibus foram contempladas na BusWorld, o maior evento de ônibus do mundo: a busca por alternativas para ampliar a autonomia dos coletivos não poluentes e a oferta de modelos de pequeno porte com baterias.

A BusWorld ocorre até 12 de outubro de 2023 em Bruxelas, na Bélgica, e tem cobertura presencial do Diário do Transporte, que viajou a convite de Mercedes-Benz.

MICRO-ÔNIBUS ELÉTRICOS:

Quanto aos micro-ônibus, na Europa, a oferta de modelos é grande, diferentemente do que ocorre no Brasil.

Quase todas as marcas visitadas pela reportagem tinham um ou mais modelos de micro-ônibus elétricos.

A questão tecnológica já foi parcialmente equacionada, com avanços que permitiram melhorias na operação e manutenção.

Sobre os custos, um dos entraves no Brasil para que haja opções de micro-ônibus elétricos, na Europa teve avanços, como nos modelos de financiamento e envolvimento do poder público na transição energética das fontes à combustão para os modelos que não dependem de queima de combustível fóssil.

Mas há ainda um problema: a baixa autonomia das baterias.

Os micro-ônibus têm menor espaço para implantar a mesma quantidade de baterias que iriam num tipo convencional ou articulado.

O fato de um micro-ônibus ser menor não significa que vai rodar menos por dia que um ônibus maior. Pelo contrário, dependendo da quantidade de viagens ida e volta nos sistema alimentador dos bairros, no fim dia, pode rodar até mais.

E como oferecer a autonomia necessária se há menos baterias?

Entre as marcas que mais exibiram micro-ônibus elétricos estão Otokar, Sigma, Karsan, Isuzu, BYD, Higer, por exemplo.

A falta ainda deste tipo de veículo no Brasil é tamanha que até mesmo a SPTrans (São Paulo Transporte), que gerencia o sistema da capital paulista e proibiu desde 17 de outubro de 2022 a compra de modelos a diesel, teve de excluir desta obrigatoriedade os micro-ônibus e os mídis (micrões). Não há oferta de modelos.

Sobre a vantajosidade econômica, a questão é mais matemática que técnica. Um ônibus elétrico pode ser até três vezes mais caro que um do mesmo porte a diesel. Quanto maior é o coletivo, mais gente o veículo vai transportar e mais dinheiro “entra por ele”.

Assim, terá maior retorno financeiro diluindo melhor proporcionalmente seu custo ao longo de da operação e vida útil.

Na capital paulista, em média, a operação dos ônibus elétricos da nova geração, com os modelos a partir de uma capacidade para 80 passageiros, vai receber subsídios 15% maiores em comparação com os ônibus a diesel.

Atualmente, se houvessem micro-ônibus elétricos no mercado de São Paulo, o percentual de subsídios poderia ser maior ainda que os 15% mais altos aplicados nas frotas padron e articulado.

Mas não deixa de ser uma oportunidade de mercado que as fabricantes instaladas no Brasil e fora do País, mas que já possuem representações por aqui estão de olho.

A chinesa Higer informou no evento na Bélgica que considera trazer o Azure 9 para o sistema de São Paulo, que se enquadraria na capacidade de passageiros transportada por micro-ônibus ou mídis (micrão).

HIDROGÊNIO:

Outra cena que foi possível perceber ao caminhar pelos pavilhões da BusWorld é que o hidrogênio tem sido considerado cada vez mais pelas fabricantes, operadores e governos não apenas como alternativa para reduzir a poluição nas cidades, como também para ampliar a autonomia dos ônibus elétricos e fazer com que rotas mais distantes, como intermunicipais e rodoviárias sejam contempladas por modelos menos poluentes também.

A infraestrutura necessária e os custos ainda têm muito avançar, mas esta tecnologia já começa a ganhar mais investimentos quanto ao desenvolvimento de modelos de ônibus.

O eCitaro Fuel Cell, da Mercedes-Benz, é um ônibus elétrico que tem duas fontes de alimentação: plug in (de recarga na rede elétrica externa) e tanques de hidrogênio com 25 kg que fazem uma extensão na autonomia, passando de 250 km com uma única carga para cerca de 400 km. O veículo é para operações urbanas, mas já vem com esta proposta de ampliação da autonomia para que futuramente a solução seja usada nas rodovias.

Os tanques são menores que os packs de baterias. Assim, é possível ter mais espaço livre e menos peso. Também podem ser usados menos packs.

Outras fabricantes também expuseram ônibus a hidrogênio, seja como fonte principal de energia ou de complemento.

No Brasil, após a paralisação de um projeto no corredor que liga municípios do ABC Paulista à capital, o hidrogênio volta a ser estudado, com a participação da USP (Universidade de São Paulo), mas desta vez com o combustível obtido a partir do etanol. A curiosidade é que o novo projeto é exatamente com os mesmos ônibus da experiência do Corredor ABD.

Um aspecto no evento que mostra que o hidrogênio é a aposta menos poluente para autonomias maiores foi a presença de modelos rodoviários/intermunicipais com este tipo de geração de energia.

A brasileira Marcopolo também trouxe um ônibus a hidrogênio para a BusWorld, mas o veículo não é para o Brasil.

Trata-se de um Audace 1050, feito pela planta da Marcopolo na China, com chassis e integração da chinesa AllenBus.

Com quatro tanques para o hidrogênio em forma de gás, a autonomia pode chegar a 500 km, e até 900 km com seis tanques.

Já há três unidades vendidas fora da Ásia. Os veículos são para Israel, dois para rotas longas e um para intermunicipal.

Mineradoras do Chile e Peru também vão operar o modelo.

A homologação para a Europa avança, mas já há negociações para a Espanha, por exemplo

No caso do Brasil, as rotas dos rodoviários são bem mais extensas que na Europa, mas ônibus menos poluentes ou não poluentes para fretamento e intermunicipais de curta e média distância, que poderiam ser mais amplamente cogitados, até começam a surgir, mas ainda estão fora dos planos para um período mais próximo.

HISTÓRICO – O HIDROGÊNIO EM ÔNIBUS NO BRASIL:

Foram apresentados em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, entre 2009 e 2015, quatro ônibus a hidrogênio, que chegaram a circular pelo Corredor Metropolitano ABD, entre a região do ABC e a capital.

O programa de ônibus a hidrogênio foi criado ainda em 1993, com participação do Ministério das Minas e Energia e recursos do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos).

Os veículos estão parados na garagem da concessionária NEXT Mobilidade, na área correspondente ao projeto de hidrogênio da EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos), gerenciadora, sem continuidade dos estudos.

O projeto Ônibus movido a Célula de Hidrogênio tinha vigência inicial até 31 de março de 2016 e os três veículos mais novos circularam no Corredor ABD até início de junho de 2016.

Na ocasião, a EMTU foi designada para ser a Coordenadora Nacional do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, que entrou com o apoio financeiro do Global Environmental Facility (GEF), além de recursos provenientes da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), por intermédio do MME. Para o desenvolvimento de todo o projeto foram destinados US$ 16 milhões.

Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2017/02/23/emtu-diz-que-projeto-de-onibus-a-hidrogenio-e-vitorioso-e-fala-do-gas-natural/

O primeiro ônibus foi apresentado em 2009 e chegou a transportar passageiros em 2010, como também mostrou o Diário do Transporte na ocasião.

Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2010/12/20/onibus-a-hidrogenio-comeca-a-rodar-com-passageiros/

O Diário do Transporte cobriu também a apresentação dos outros três ônibus.

Os veículos foram mostrados em uma cerimônia no dia 15 de junho de 2015, às 10 horas, na época da gestão de Geraldo Alckmin frente ao Governo de São Paulo.

Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2015/06/15/emtu-apresenta-mais-tres-onibus-a-hidrogenio-no-abc-paulista/

A reportagem acompanhou as fases de testes.

Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2016/03/07/testes-com-passageiros-nos-onibus-a-hidrogenio-do-corredor-abd-vao-ate-o-dia-31-de-marco/

No dia 10 de agosto de 2023, a EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) e a USP (Universidade de São Paulo) anunciaram o início de um projeto com ônibus movidos à hidrogênio e a construção de uma estação para ter capacidade de produzir em torno de 5 kg do combustível por hora.

O hidrogênio é obtido a partir do etanol.

O projeto custou em torno de R$ 182 milhões. A estação conta com edifício, instalações e equipamentos.

As células a combustível produzidas pela estação geram eletricidade internamente a partir do hidrogênio.

Os testes envolveram três ônibus, que circularão pelo Campus da USP, na região do Butantã, zona Oeste da capital paulista, e um carro da Toyota que também participa do projeto, juntamente com a Shell, Raízen, Senai e Hytron.

Os ônibus já circularam pelo Corredor Metropolitano ABD, num projeto que não avançou, e foram reformados pela encarroçadora Marcopolo, por meio de um contrato de R$ 671 mil (R$ 671.624,79), como mostrou o Diário do Transporte no dia 11 de abril de 2023.

Relembre:

https://diariodotransporte.com.br/2023/04/11/marcopolo-assina-convenio-com-a-usp-e-vai-atualizar-carroceria-em-projeto-de-onibus-a-hidrogenio-obtido-do-etanol/

O governador Tarcísio de Freitas disse, em nota, que devem ser criadas leis e alterada a legislação atual para incentivar a produção de hidrogênio como combustível.

“Vamos estruturar a legislação, marcos regulatórios e fomentar essa produção para que a gente ganhe escala e São Paulo, de fato, seja líder na transição energética que vai diminuir nossa pegada de carbono e dar exemplo de sustentabilidade e economia circular. Estou muito feliz de ser testemunha do esforço, do talento e da criatividade do nosso pesquisador brasileiro, do nosso pesquisador paulista”

Etanol e Hidrogênio:

A USP, o Senai e as empresas Shell Brasil, Raízen e Hytron assinaram em 1º de setembro de 2022, um acordo de cooperação para o desenvolvimento de duas plantas de produção de hidrogênio renovável a partir do etanol.

Serão construídas duas plantas dedicadas à tecnologia de produção de hidrogênio a partir do etanol, uma com capacidade para produzir 5 kg/h de hidrogênio e a outra quase 10 vezes maior, com capacidade de 44,5 kg/h.

Segundo a Universidade, o acordo também contempla a construção de uma estação de abastecimento veicular para os ônibus que circulam pela Cidade Universitária, em São Paulo. Com início da operação previsto para o segundo semestre 2023, a estação será um dos primeiros postos a hidrogênio do mundo, diz a USP.

O modelo utilizar hidrogênio produzido a partir do etanol e motores equipados com células a combustível (fuell cell). A iniciativa surge como uma solução de baixo carbono para o transporte pesado, incluindo caminhões e ônibus.

A tecnologia será desenvolvida e fabricada pela Hytron, do grupo alemão Neuman & Esser (NEA), com suporte do Instituto Senai de Inovação em Biossintéticos e Fibras do Senai Cetiqt.

A Marcopolo foi escolhida para atualizar a carroceria do ônibus movido a hidrogênio obtido do etanol no projeto entre a USP, Raízen e Shell.

Convênio no valor de R$ 671 mil (R$ 671.624,79) entre a encarroçadora e a USP – Universidade de São Paulo (USP/EP, Unidade EMBRAPII Poli USP Powertrain) foi publicado em Diário Oficial do Estado de São Paulo de 11 de abril de 2023.

A assinatura ocorreu um dia antes com validade por 12 meses.

O documento prevê a reforma de inicialmente um dos três ônibus modelo Viale a hidrogênio apresentados em 2015 em um projeto entre EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) e o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Se der certo, os outros dois ônibus devem ser reformados.

No projeto apresentado anteriormente no Corredor ABD, os veículos dependiam do hidrogênio obtido pelo processo denominado eletrólise que separa o hidrogênio da água.

Estudos iniciais da USP mostram que este procedimento, para a obtenção do combustível pode ser mais caro e mais poluente do que o hidrogênio a partir do etanol.

Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

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Comentários

Comentários

  1. Rodrigo Zika disse:

    No Brasil existe muita resistência pra hidrogênio e outras tecnologias, o elétrico a bateria só começou em SP pela obrigação mesmo, sobre micro ônibus realmente aqui tá em falta várias opções, ao menos a eletra já criou o primeiro modelo que servirá de parametro para as demais empresas, e essa marca Isuzu na Ásia é bem famosa pra pequenos caminhões, pois vejo bastante conteúdo das Filipinas.

  2. Antonio disse:

    A explosão de um Veículo de Hidrogênio, no caso de uma colisão e’ muito maior, o movido ‘a gás GLP. Porém, sua autonomia de é 12 vezes maior, do que a do gás GLP.

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