Estudo do Greenpeace mostra que São Paulo já poderia cumprir Lei de Mudanças Climáticas se quisesse

São Paulo possui apenas 201 trólebus. Rede foi reduzida em 2003

Além das vantagens em relação à redução de poluição, os dados comparam as informações fornecidas pelas fabricantes, as vantagens econômicas dos modelos e mostram a capacidade de produção da indústria nacional de ônibus limpos

ADAMO BAZANI

Um extenso relatório com dados técnicos elaborados pelo Greenpeace, ao qual o Diário do Transporte teve acesso na íntegra, mostra que a cidade de São Paulo poderia cumprir sim a lei 14.933, de 5 de junho de 2009, chamada de Lei de Mudanças Climáticas que, entre outros aspectos, determina que até 2018 nenhum ônibus em São Paulo dependa exclusivamente de óleo diesel para se movimentar. Mas para isso, conclui o estudo, a lei deveria ter sido levada a sério desde o início.

Desde a promulgação da lei em 2009, 10% da frota deveriam ser trocados até 100% em 2018. No entanto, São Paulo tem menos de 300 ônibus de fato pouco poluentes ou com poluição zero, incluindo os 201 trólebus, de uma frota total de 14.782 veículos.

A alegação do poder público e das empresas de ônibus é que não haveria tempo hábil e capacidade industrial para atender a legislação.

Mas com base nos números apresentados pelas fabricantes e em pesquisas sobre outros sistemas, inclusive internacionais, o Greenpeace diz que São Paulo está muito atrasada em relação aos veículos limpos e ao cumprimento da Lei de Mudanças Climáticas.

Se todo o percentual previsto para 2018 não fosse alcançado, se a lei fosse considerada, pelo menos uma grande parte da determinação já poderia ter sido atendida.

Veja um dos trechos da conclusão do relatório:

“A viabilidade técnica de substituir o óleo diesel por combustíveis renováveis na frota de ônibus de São Paulo é comprovada desde 2009, quando a cidade foi pioneira em estabelecer sua lei municipal de clima. O percentual de 10% ao ano para a transição dos combustíveis foi determinado a partir de diversos pareceres técnicos. Essa obrigação legal, no entanto, vem sendo negligenciada e postergada pelas empresas concessionárias do setor de transporte com a conivência do poder público municipal sob a justificativa de inviabilidade técnica. Não podemos mais aceitar esses argumentos. Como demonstrado ao longo deste relatório, a transição para combustíveis renováveis é um importante vetor de desenvolvimento econômico, estímulo à inovação e promoção da saúde no espaço urbano. Mesmo seu custo inicial de implementação, um investimento necessário ao bem-estar da população, torna-se viável a partir de medidas como o leasing, além de ser amenizado ou mesmo revertido com o passar do tempo. A transição se torna ainda mais imperativa após a ratificação do Acordo de Paris, no qual o Brasil estabeleceu o compromisso de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 (tendo como referência o ano base de 2005). Por representar 46% das emissões totais de energia, o setor de transporte é parte fundamental de qualquer estratégia de mitigação, além de ser o que mais cresce em emissões e possuir altíssimo impacto na saúde da população, especialmente em grandes cidades. Diante de uma exigência legal existente desde 2009, de amplo conhecimento do setor, e que já estabelecia um processo gradual de adaptação às empresas concessionárias, não é aceitável considerar qualquer possibilidade de anistia àquelas que não cumprirem a meta de substituir totalmente o diesel em seus veículos até 2018.”

SISTEMA MAIS BARATO:

O relatório também mostra que o cumprimento da Lei de Mudanças Climáticas poderia fazer com que o sistema de transporte de São Paulo fosse mais barato Hoje uma das grandes discussões é justamente o alto custo que não é coberto pelas tarifas e que necessita de subsídios, somente neste ano vão ultrapassar R$ 2,39 bilhões, valor que poderia ser investido em outras áreas carentes da cidade, como saúde educação, ou mesmo no transporte, como para a construção de corredores de ônibus.

Em um dos gráficos, já levando em conta os modelos disponíveis no mercado, o Greenpeace mostra que o custo global de alguns veículos seria menor, como o modelo Híbrido BR, da Eletra e o elétrico puro da BYD

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CAPACIDADE INDUSTRIAL:

Outro argumento utilizado para defender a não implantação dos ônibus elétricos ou com outras formas de tração menos poluentes é que a indústria não teria capacidade de atender à demanda da capital paulista.

O Greenpeace entrou em contato com as três maiores fabricantes destes modelos: a chinesa BYD, instalada em Campinas, a Volvo, em Curitiba, e Eletra, em São Bernardo do Campo.

Segundo os técnicos da organização em prol do meio ambiente, com base nos dados apresentados, São Paulo poderia agora estipular um programa ousado, porém realista, para que os ônibus fossem menos poluentes.

Tais números demonstram que os argumentos apontados pela SPTrans para não implementar uma política de substituição dos veículos que usam combustível fóssil são questionáveis e precisam ser mais bem avaliados. Os fabricantes garantem que há vantagens econômicas implicadas na compra de seus produtos, além de todas as melhorias que isso proporcionaria ao meio ambiente e aos usuários dos serviços. E pelo que pudemos comprovar, essas vantagens são bastante relevantes.

Segundo Ayrton Amaral, a fábrica da Volvo está pronta para produzir cerca de 600 unidades do modelo Híbrido Volvo por ano. Esse número poderia ser ainda maior se a demanda justificasse a nacionalização de componentes que hoje são importados. Possivelmente, a produção saltaria para 1 mil veículos/ano, o que significaria a contratação de 100 novos funcionários. Havendo a devida demanda, a empresa brasileira Eletra assegura que, em até 10 meses, é capaz de produzir 2.400 veículos anualmente. Para viabilizar o aumento de produção, Iêda Oliveira afirma que seriam necessários 550 novos funcionários. Ela lembra ainda que esses números se referem apenas a empregos diretos e, sendo a Eletra uma fábrica que está na ponta da cadeia produtiva, já que integra partes produzidas por outras indústrias, o número seria muito maior, ao contabilizar o restante da cadeia.

Já a BYD tem capacidade de produzir 500 unidades por ano. A previsão é de que, se houver a quantidade de pedidos que a empresa espera receber nos próximos anos, seja possível aumentar a produção para 2 mil veículos anuais. Para isso, a fábrica poderia incorporar 1.400 novos funcionários à sua planta.

Confira o estudo na íntegra:

ESTUDO GREENPEACE ÔNIBUS LIMPOS

Adamo Bazani, jornalista especializado

Comentários

Comentários

  1. Isso e uma coisa muito óbvia, o problema, e as empresas quererem.

  2. Luiz Alves disse:

    Apesar de interessante o estudo, não foi computado os valores dos trólebus e ainda mais interessante o custo de operação baixo do BYD apesar do preço salgado para aquisição.

  3. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa tarde.

    O Brasil so sabe fazer leis, mas cumpri-las NAO CONSEGUE, afinal ha excesso.

    Att,

    Paulo Gil

  4. O Greenpeace está se apoiando em informações que não são neutras, produzidas por fornecedores das tecnologias alternativas. Outro problema é que não incluíram na avaliação a alternativa gás natural, que pode ser o caminho inicial que levará ao desenvolvimento do biometano como combustível renovável automotivo. Não estou afirmando que os fornecedores de tecnologias são desonestos, mas que é imprescindível que seja desenvolvido um trabalho aprofundado de avaliação técnico-econômica, como sugere brilhantemente o Silvio em seu comentário acima. Antes disso, qualquer número apresentado poderá levar a decisões eventualmente equivocadas e arriscadas. Por outro lado, o Greenpeace acerta quando critica a postura paralítica do governo municipal, que poderia ter avançado bastante nesses estudos e na adoção das tecnologias mais baratas e menos poluentes, mas ao invés disso ficou durante sete anos sossegado caçando mosca e olhando a banda passar, e nada fez. Espero que o Natalini dê um jeito nessa lenga-lenga da SPTrans. Finalmente, é necessário chamar a atenção de todos também para o fato de que existem recursos bilionários nos fundos internacionais de financiamento de projetos de baixo carbono em países em desenvolvimento, só aguardando projetos confiáveis de substituição de frota para financiá-los.

  5. Fui injusto neste comentário e o reeescrevo com as devidas correções: O Greenpeace está se apoiando em informações que não são neutras, produzidas por fornecedores das tecnologias alternativas. Outro problema é que não incluíram na avaliação a alternativa gás natural, que pode ser o caminho inicial que levará ao desenvolvimento do biometano como combustível renovável automotivo. Não estou afirmando que os fornecedores de tecnologias são desonestos, mas que é imprescindível que seja desenvolvido um trabalho aprofundado de avaliação técnico-econômica, como sugeriu brilhantemente o Silvio Figueiredo em um comentário. Antes disso, qualquer número apresentado poderá levar a decisões eventualmente equivocadas e arriscadas. Por outro lado, o Greenpeace acerta quando critica a postura paralítica do governo municipal, que poderia ter avançado bastante nesses estudos e na adoção das tecnologias mais baratas e menos poluentes, mas ao invés disso ficou durante sete anos só atuando num Programa Ecofrota extremamente limitado. Espero que o Natalini dê um jeito nesse Programa. Finalmente, é necessário chamar a atenção de todos também para o fato de que existem recursos bilionários nos fundos internacionais de financiamento de projetos de baixo carbono em países em desenvolvimento, só aguardando projetos confiáveis de substituição de frota para financiá-los.

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