Rio Ônibus diz em carta ao prefeito Crivella que congelamento de tarifa é “flagrante desrespeito ao contrato”

Transportes América, uma das empresas paradas ontem

Sindicato fala em empresas de ônibus “no fundo o poço” e pede “avaliação técnica”

ADAMO BAZANI

O Rio Ônibus, que é o sindicato que representa as empresas de transportes de passageiros da cidade do Rio de Janeiro, divulgou no início da manhã desta quarta-feira, 29 de novembro de 2017, uma carta pública direcionada ao prefeito Marcelo Crivella, na qual acusa a administração de ter cometido “flagrante desrespeito ao contrato de concessão assinado em 2010”, em referência ao congelamento da tarifa municipal.

Em tom ríspido, a carta, assinada pelo presidente do Rio Ônibus, Claudio Callak, ainda diz que uma “insegurança jurídica” vem sendo “patrocinada pelo Poder Público” desde 2013, quando houve o primeiro congelamento das tarifas.

A entidade ainda diz que neste ano, o custo do óleo diesel subiu 18% e que por causa do congelamento tarifário desde janeiro, esse reajuste foi assumido “por um setor já combalido financeiramente”.

O documento também critica o que as empresas consideram de excesso de gratuidades: 40% dos usuários (1,6 milhão de passageiros) são transportados gratuitamente pelos ônibus.

O Rio Ônibus acusa a administração de ter cometido “desacertos” que levam as companhias de ônibus “ao fundo do poço”. As empresas admitem que, por causa da atual situação a “qualidade do serviço” para os passageiros tem se degradado “dia após dia”.

A carta ainda faz uma rápida referência, não de forma detalhada, às denúncias de crime de corrupção que envolvem agentes públicos e os donos das viações. O maior empresário de ônibus do Rio de Janeiro, Jacob Barata Filho, está preso pela segunda vez somente neste ano. Na primeira vez, foi beneficiado pelo ministro do STF – Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que em 2013, foi padrinho de casamento da filha do empresário.

À Justiça caberá decidir sobre acusações de irregularidades ocorridas no passado, envolvendo tanto o setor de ônibus quanto agentes públicos. – diz a carta, que ainda pede uma avaliação técnica sobre a situação por parte de Crivella.

Ontem, os passageiros de transportes do Rio de Janeiro de quatro empresas que operam na zona Norte tiveram dificuldades por causa da paralisação dos funcionários.

A Viação Nossa Senhora de Lourdes estava parada desde segunda-feira, 27, por causa de uma proposta de parcelamento do 13º salário. A operação só foi normalizada na tarde de terça-feira.

Já as empresas Rubanil, América e Madureira Candelária foram paralisadas ontem por causa de atraso no pagamento dos salários dos funcionários.

Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

CONFIRA CARTA NA ÍNTEGRA:

CARTA ABERTA AO PREFEITO

MARCELO CRIVELLA

 

Sr. Prefeito,

 

Vossa Excelência foi eleito em outubro de 2016 o administrador da nossa cidade. Com uma campanha que prometia “cuidar das pessoas”, conquistou 1,7 milhão de votos. Hoje, pouco mais de um ano depois, fazemos um apelo público para que seu slogan demonstre, de fato, preocupação com os 4 milhões de cidadãos que andam de ônibus todos os dias no Rio de Janeiro. E também com os 40 mil rodoviários que têm seus empregos ameaçados por conta do risco iminente de falência de várias empresas.

 

  • Decisões unilaterais da Prefeitura, tomadas ao longo dos últimos anos, levaram o sistema municipal de ônibus a um grave e perigoso desequilíbrio contratual.

 

  • O congelamento da tarifa imposto por sua gestão em janeiro deste ano, assim como já ocorrera em 2013 – em flagrante desrespeito ao contrato de concessão assinado em 2010 – é, infelizmente, uma insegurança jurídica patrocinada pelo Poder Público.

 

  • A oferta de gratuidades a passageiros significa a criação de despesas que impactam o equilíbrio econômico-financeiro do sistema. Por exemplo, conceder passe-livre a universitários sem que a Prefeitura pague essa conta. Hoje, cerca de 40% dos usuários (1,6 milhão de passageiros) são transportados gratuitamente pelos ônibus.

 

  • Há dois anos sem reajuste da tarifa, a elevação do custo de insumos como o óleo diesel – que teve aumento aproximado de 18% somente em 2017 – é integralmente assumida por um setor já combalido financeiramente.

 

  • O mesmo ocorre em relação à climatização integral da frota, um compromisso assumido unilateralmente pela Prefeitura, sem que as empresas de ônibus tenham sido consultadas. Somos favoráveis a esse processo, desde que haja fonte de custeio para o investimento.

 

  • A situação é agravada pelo estímulo ao transporte clandestino de passageiros por meio de vans e Kombis, frequentemente à margem da lei e da fiscalização.

 

  • O cenário de colapso que vem sendo anunciado desde o início do ano já é uma realidade não só para as empresas – que, além do congelamento da tarifa, enfrentaram duas reduções no valor da passagem determinadas pela Justiça – mas principalmente para o passageiro, que vê a qualidade do serviço se degradar dia após dia.

 

  • O resultado dessa sequência de desacertos são empresas no fundo do poço: sete delas já encerraram suas atividades e pelo menos outras 15 estão prestes a paralisar suas operações.

 

  • São dezenas as empresas que perderam a capacidade financeira para honrar compromissos trabalhistas com a categoria, como o pagamento de salários e do 13º.

 

  • A recente decisão da Câmara Municipal que impõe o retorno dos cobradores aos ônibus representa um retrocesso em relação aos avanços obtidos com a bilhetagem eletrônica, que serve como ferramenta de controle e assegura os níveis de transparência exigidos pela sociedade. Ter menos dinheiro em circulação nos ônibus colabora para pôr fim ao mito da caixa-preta.

 

Em nome das 38 empresas consorciadas, o Rio Ônibus apela publicamente para que o prefeito Marcelo Crivella se disponha a participar de uma avaliação técnica e transparente sobre a situação. À Justiça caberá decidir sobre acusações de irregularidades ocorridas no passado, envolvendo tanto o setor de ônibus quanto agentes públicos. Mas, juntos, poderemos dialogar em busca de melhorias para o sistema adotado por 70% dos usuários de transporte público do Rio e evitar, assim, que milhões de cidadãos sejam prejudicados.

 

Claudio Callak

Presidente do Rio Ônibus

Comentários

Comentários

  1. João Luís Garcia disse:

    Parabéns a atitude da Rio Ônibus pois vir a público expor a real situação do setor naquela cidade em um País sério seria uma atitude normal, mas infelizmente em um País como o nosso eles ainda serão execrados por grande parte opinião pública e principalmente pela classe política, a mesma classe política vem tomando atitudes meramente eleitoreiras e não respeitam os contratos de concessões
    A cláusula de reajuste está prevista no contrato, e se já não bastasse o desrespeito do executivo ainda temos atualmente o Judiciário que passou a interferir na concessão ou não dos reajustes
    Caminhamos para um profundo colapso do transporte daquele município, que já foi tido como um dos melhores do País
    Triste realidade

    1. Renato disse:

      Do jeito que você fala, nem deve morar aqui pra saber a “real situação” das coisas. Vamos por partes.

      1º – A Rio ônibus fala em contrato, mas no contrato prevê também a boa prestação de serviços, o que acontece em partes, porque em partes, as empresas que estão hoje em má situação financeira, com ônibus caindo aos pedaços, greves e etc….já vinham caminhando pra isso muito antes do congelamento tarifário. Esse chororo é pra ver se “cola”.

      2º – Tivemos dois aumentos acima da inflação, o de 2016 foi acima da inflação com a desculpa de ajudar as empresas a equiparem a frota com ar condicionado (tudo bem, a climatização não está no contrato) mas as empresas tiveram aumento acima e ficaram quietinhas.

      3º – Estava havendo uma auditoria com uma empresa privada para rever o valor justo da passagem, ainda no governo PaPaes, do nada, depois de gastarem milhões, cancelaram tudo e deixaram por assim mesmo (alguém ganhou algum por fora?).

      4º – Se fala em passagem, mas grande parte das empresas demitiram todos os cobradores e fizeram o motorista ter dupla função, não e possivel que não tenha sobrado algum tutu pra não acontecer isso que vemos hoje.

      Resumindo: Não sei como a Rio ônibus tem a cara de pau de fazer isso ai.

  2. Joao Luis Garcia disse:

    Bom dia

    Realmente não resido no Rio de Janeiro, mas creio que uma pessoa para emitir sua opinião sobre o acontece no transporte público dessa cidade necessariamente deva residir na mesma.
    Primeiro contrato existe para regular o serviço e em todos os contratos existem regras com obrigações e direitos tanto da contratante como da contratada.
    Se uma parte não cumpre uma cláusula a outra parte deve aplicar aquilo que está previsto no contrato, aplique a punição cabível até a cassação da concessão em último caso.
    O que não se pode e penalizar uma categoria inteira em função de uma ou outra operadora.
    Quem opera mal deve ser punido, assim como o estado se não cumpre o contrato ao deixar de aplicar o reajuste previsto.
    Quanto aos 2 aumentos que o Sr afirma serem acima da inflação, a minha pergunta é, quem afirmou ? O Judiciário ?
    Que embasamento técnico possui o judiciário para afirmar tal fato ?
    A concessão do transporte público é sempre foi uma prerrogativa do município, não cabe ao judiciário afirmar e decidir.
    Para isso existem meios técnicos que podem aplicados.
    A Rio Ônibus defende uma auditoria independente para a real averiguação.
    A retirada dos cobradores não se trata de fazer sobrar mais ou menos para a concessionária uma vez que a grande maioria dos funcionários foram absolvidos em outras funções dentro das próprias empresas.
    Hoje com o sistema de bilhetagem eletrônica a função do cobrador assim como já aconteceu em outras cidades do mundo é uma função que não tem mais sentido.
    O sistema de pagamento eletrônico veio para ficar basta ver não só no transporte como no cotidiano de nossas vidas.
    Agora os sistemas atuais requerem investimentos das concessionárias, creio que muitas pessoas atualmente imaginam que ao implantar a bilhetagem eletrônica as empresas passam somente a arrecadar mais, engano pois os sistemas exigem altos investimentos tanto em equipamentos como em sistemas e muitas vezes esses investimentos não estavam previstos nos contratos.
    Defendo o cumprimento dos contratos em todos os sentidos, que se cobre a boa execução do serviço mas que se dê a condição para tanto.
    Que os maus concessionários sejam punidos e o poder concedente responsabilizado e penalizado de acordo com a regra existente.
    Que o Poder Judiciário limite-se a julgar a execução da Leí.
    Att.

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