Frota Limpa: Lei de mudanças climáticas não foi levada a sério

Lei de Mudanças Climáticas

Trólebus em São Paulo. Cronograma de renovações, com a inclusão de 10% de ônibus não poluentes na frota da cidade por ano até 2018 não foi seguido. Lei de Mudanças Climáticas foi desrespeitada. Foto: Adamo Bazani.

 

Frota Limpa: Lei de mudanças climáticas não foi levada a sério

Licitação dos transportes na cidade de São Paulo não faz exigências para a ampliação de ônibus não poluentes e poder público já admite que lei não será cumprida

ADAMO BAZANI

No dia 05 de junho de 2009, portanto há mais de seis anos, a lei 14.933, a Lei de Mudanças Climáticas da cidade de São Paulo, entrava em vigor.

A principal meta era a redução de 30% nas emissões de poluentes atmosféricos nos quatro anos seguintes, até 2013.

Para isso, seria adotada uma série de iniciativas. Entre elas, toda a frota de ônibus municipais movida por combustíveis não sejam fósseis em 2018.

Mas, a lei era clara ao não prever uma mudança da noite para o dia na configuração dos ônibus da Capital Paulista. De acordo com texto divulgado pela própria prefeitura de São Paulo, em 209 de agosto de 2009, a alteração seria gradual, com a ampliação de 10% ao ano da frota movida por combustíveis limpos: “ (A lei) Também propõe a redução progressiva do uso de combustíveis fósseis, adotando meta progressiva de redução de 10% ao ano, com o uso de combustível renovável não fóssil pelos ônibus do sistema de transporte público.” No mesmo texto, a prefeitura enfatiza o trólebus e a ampliação dos corredores de ônibus para que a meta de redução das emissões de poluentes fosse alcançada: “Para chegar à meta de redução de 30% das emissões nos próximos quatro anos, a proposta da Política de Mudanças do Clima aponta estratégias que incluem, na área de transportes, a priorização dos coletivos, estímulo ao uso de meios de transporte com menor potencial poluidor, priorização do uso dos trólebus, metrô, trem e outros meios de transporte utilizadores de energia renovável, o monitoramento e armazenamento de cargas privilegiando o horário noturno, a implantação de corredores de ônibus, programas e incentivos para carona solidária e transporte compartilhado…”

A Lei de Mudanças Climáticas não nasceu do nada ou do mero sonho dos apaixonados pela natureza. Ela teve como base o “Inventário de Emissões de Gases do Efeito Estufa do Município de São Paulo”, de julho de 2005. As metas e obrigações da lei foram discutidas desde 2007, antes da promulgação pelo então prefeito Gilberto Kassab no ano de 2009.

Mas passado todo este tempo, em relação aos transportes coletivos, quase nada da lei de mudanças climáticas teve o avanço necessário.

Os corredores de ônibus estão praticamente empacados. Na verdade, em gestões anteriores, o transporte coletivo pouco foi priorizado. As licitações dos corredores foram lentas e hoje a administração municipal, após desentendimentos políticos com o TCM – Tribunal de Contas do Município que não aprova as obras, erros em alguns projetos e falta de recursos, não deve cumprir a promessa de campanha de entregar até 2016, 150 quilômetros deste tipo de espaço.

Sobre a frota limpa, a cidade empacou de novo.

O número de trólebus não sai dos 200 veículos e são poucos os modelos com outras tecnologias não poluentes operando ou ao menos sendo testados na cidade.

São Paulo está às vésperas de uma licitação dos transportes e da tão necessária reorganização do sistema. Mas a prefeitura pouco prevê a colocação em larga escala de ônibus não poluentes. Seria necessário ao menos um cronograma modesto para que os investimentos iniciem.

Agora seria mesmo inconsequente exigir que as empresas de ônibus tenham toda a frota movida por combustível não fóssil em 2018. Isso porque, se perdeu muito tempo.

Uma mudança deste tipo, que exige investimentos e até mesmo testes de tecnologias, deveria ser feita aos poucos, como previa a lei, com 10% de inclusão ao ano.

Se, mesmo assim, a meta de 10% fosse muito diante da realidade dos preços de aquisição dos ônibus, que se alterasse de forma satisfatória a lei. Mas nem isso ocorreu na prática. O que prova que a lei não foi levada a sério. Nem discussão sobre eventuais alterações ocorreu direito, passando a sensação de que se ela não for cumprida, tudo bem, isso é normal no Brasil.

Aliás, não cumprir a lei é prática comum principalmente por aqueles que elaboram e devem executar as leis.

Não é assunto de “eco chato”. Poluição mata de verdade, reduz a qualidade de vida e causa prejuízos financeiros.

Frota limpa é realidade em diversas partes do mundo. É o passo para menor dependência do petróleo e também para uma qualidade do ar necessária.

Indústria de ônibus limpos há no Brasil. A Eletra, de São Bernardo do Campo, a Volvo, em Curitiba, e agora a BYD, em Campinas, são exemplos de fábricas que já produzem há um bom tempo ou vão começar a produzir ônibus menos poluentes.

Uma das desculpas para a não renovação de frota com ônibus limpos é de que elas não dariam conta da demanda. Claro, da noite para o dia não mesmo. Mas se a lei fosse levada a sério e o cronograma respeitado, elas se adaptariam e também outras fabricantes poderiam ser atraídas para o Brasil. Isso sem contar as indústrias já instaladas que poderiam desenvolver novos projetos.

Outra desculpa é o preço de aquisição e as dúvidas em relação ao desempenho de muitas destas tecnologias não poluentes. Ora, mas a lei é clara em afirmar que deve haver “estímulo” aos veículos que emitem menos poluentes. Estímulo não é apenas assinar uma lei ou dizer “vai lá e faça, eu estou torcendo”. Estímulo é criar condições para que algo aconteça.

Financiamentos diferenciados para ônibus elétricos, por exemplo, não pesariam tanto no bolso se o meio ambiente fosse levado a sério assim como se fossem calculados os bilhões gastos por ano para deixar nossos pulmões sujos.

Empresário de ônibus é e deve ser pragmático. Ele quer investir no que dá retorno imediato porque seus altos custos de operação também são imediatos. Se a operação de um ônibus não poluente não fechar a conta, ele não vai investir mesmo. Cabe ao poder público oferecer a contrapartida justa e exigir depois.

Há quem diga que os ônibus limpos não avançam em São Paulo porque os mesmos empresários operadores são revendedores de ônibus diesel.

No entanto, as mesmas montadoras que fazem chassi diesel, oferecem as plataformas para trólebus e híbridos, como Mercedes-Benz, Scania e Volvo.

Se for a lógica da venda, não é melhor para os empresários repassarem aos seus parceiros de negócios na cidade veículos com maior valor agregado?

Não dá para esconder que empresário ainda prefere o diesel, uma tecnologia consolidada há mais tempo, mas se o poder público (federal, estadual e municipal) oferecer condições de compra, financiamento e remuneração, os frotistas podem se interessar.

Há também a questão da demanda. Se um cronograma fosse seguido, aumentariam as vendas, a concorrência entre as produtoras e, nem que seja um pouco, o preço cairia.

Não adianta agora chorar pela fumaça derramada. A lei com toda a frota movida por combustível renovável não vai ser cumprida. Basta então não perder mais tempo e reeditar esta lei, com um cronograma sério e condições reais para que ela não caia novamente no esquecimento.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

Comentários

Comentários

  1. J disse:

    Eu não vi mais nenhum dos Trolebus antigos…das linhas da SPTrans! A não ser os da METRA q são muitíssimo bem conservados! bem como os antiquíssimos veículos a Diesel q eles ainda tem ou tinham a pouco tempo atrás!

  2. Ricardo disse:

    Ao promover um edital dessa magnitude sem atender o que prevê a lei de mudanças climáticas o mesmo deve desse impugnado.

  3. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa noite.

    O edital nao cumprir essa lei e o “pulo do macaco”.

    Vejam so.

    Qualquer entidade ambiental pode, no minimo, atrasar mais ainda esta licitacao utilizando como fundamento legal o descumprimento desta lei, pelo fato do edital nao contemplar tal questao.

    BINGO !

    Esse e o resultafo previsivellllllll e esperado.

    E a justificativa perfeita para firmar contratos emergenciaia a “moda da casa”.

    Hoje as por volta das 7:20 hs passei pela Avenida Ibirapuera e vi um lindo desfile (ate em fila mesmo) de todos os tipos de articulados; o basiquinho, o linguicao e o trucadinho sucesso, inclusive uns com ar condicionado e vidro colado.

    TODOS BATENDO LATA (mesmo no sentido centro bairro).

    Depois dessa fadada licitacao (se ocorrer e claro), nem marciano vai acreditar que esses articulafos vao continuar a rodar ” batendo lata” com uma taxa de retorno menor.

    Mas qualquer E.T., sabe que os novos contratos emergenciais serao firmados.

    Ja dizia “Pantaleao”

    E mentira Terta ??????

    Att,

    Paulo Gil

    1. Paulo Gil disse:

      Corrigindo:

      A lata era batida no sentido BAIRRO CENTRO, pois ao contrario a lata e obvia.

      Att,

      Paulo Gil

  4. neblinasp disse:

    A Marta Suplicy cometeu um crime quando acabou com os trólebus que iam de Santo amaro até o terminal bandeira linha 6500, única linha de ônibus elétricos na zona sul, ônibus macios, silenciosos, quase sem trancos, apenas o problema dos cabos se desligarem da rede elétrica, mas de resto era ótimo.

  5. olimpioa disse:

    Acho que a Prefeitura de SP tem uma grande oportunidade politica nas mãos com esse nao-cumprimento da Lei de Mudança Climatica para encaixar uma revisao parcimoniosa desta lei com metas racionais exequiveis com a devida previsao orçamentaria responsavel, aliada a um pacote de medidas compensatorias simples e baratas que podem trazer enormes ganhos ambientais para a cidade. Um exemplo disso sao os filtros adaptados de material particulado fino diesel (retrofits), que reduzem o particulado nanometrico cancerigeno em 99% – entre outras ações facilmente implementaveis. Os fltros tb podem ser exigidos por lei para onibus de fretamento, caminhoes de lixo e motogeradores. Assim, a prefeitura passará de vilão a mocinho da causa ambiental num piscar de olhos.

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