EDITORIAL: Qualidade do transporte deve ter padrões nacionais

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Realidades de operação são diferentes de acordo com cada região, mas em todo o País deve haver parâmetros básicos para que o passageiro tenha o mesmo atendimento independentemente de onde ele mora. Montagem – Diversas fontes

EDITORIAL: Qualidade do transporte deve ter padrões nacionais
As peculiaridades de cada região devem ser respeitadas, mas algumas exigências deveriam servir para o País todo evitando distorções
ADAMO BAZANI – CBN
O Brasil é um país de dimensões territoriais com características distintas em cada região que vão desde o clima, topografia, comportamento da população e fatores históricos.
Isso é refletido no setor de transporte coletivo de passageiros que está inserido na realidade e no desenvolvimento de cada uma destas regiões.
Assim, exigir que as operações de transporte numa área rural que sequer conta com vias pavimentadas ocorram da mesma forma que em grandes centros urbanos seria algo próximo da demagogia.
Mas também é necessário entender que o País, apesar de suas diversas realidades, é um só e está cada mais interligado. A população brasileira como um todo precisa de um tratamento digno na prestação de serviços, inclusive no setor de transportes.
Assim, faltam no País padrões gerais de exigências de qualidade que universalizem a prestação de serviços de transportes.
O passageiro da área rural onde não há sequer pavimentação merece o mesmo tratamento que o passageiro de uma cidade dotada de corredores de ônibus e sistemas mais modernos de mobilidade. Note bem: as formas de operação nestas duas realidades são diferentes, mas o tratamento para com o passageiro deve ser o mesmo.
Cada cidade e estado deve respeitar suas características e assim legislar sobre os transportes. Os municípios e os entes federativos devem ter liberdade de gestão.
No entanto, isso tem gerado também muitas distorções que prejudicam a todos: o passageiro, a própria gestão pública e os operadores de transportes coletivos. E aí, a sociedade vive exposta a dois extremos de realidade: enquanto em algumas cidades os transportes sequer possuem uma fiscalização decente, com serviços ruins prestados de qualquer maneira, em outras há verdadeiras exigências absurdas que só atrapalham o trabalho das empresas de ônibus e encarecem desnecessariamente as tarifas para os passageiros.
A lei 12.587 de 2012, que institui a Política Nacional de Mobilidade Urbana, e a lei 8.987, de 1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, trazem exigências sobre a qualidade dos serviços e também o que pode ser ou não ser exigido pelo poder público. São duas leis que representam, cada uma ao seu tempo, avanços importantes, sendo que uma não anula a outra.
Ambas estipulam que os serviços de transporte devem ser prestados com qualidade e deve haver cumprimentos de metas.
No artigo 10 do Capitulo II, da lei 12 mil 587, sobre as “Diretrizes para a Regulação dos Serviços de Transporte Público Coletivo”, é determinado que:
“Art. 10. A contratação dos serviços de transporte público coletivo será precedida de licitação e deverá observar as seguintes diretrizes:
I – fixação de metas de qualidade e desempenho a serem atingidas e seus instrumentos de controle e avaliação;
II – definição dos incentivos e das penalidades aplicáveis vinculadas à consecução ou não das metas;”
Já no artigo sétimo do Capítulo III da lei 8.97, é exigida também a prestação de serviços adequada:
“I – receber serviço adequado;
II – receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses individuais ou coletivos;”
Mas o que é serviço adequado? Quais metas de qualidade e desempenho devem ser alcançadas? Como estipular estas metas?
Ainda hoje, cada legislador local pode exigir o que lhe der na telha ou simplesmente pode não exigir praticamente nada se caso o empresário for apoiador de campanha ou fazer favores pessoais aos gestores públicos prejudicando a população e um ambiente de concorrência que daria espaço para o bom operador de transporte público.
Para deixar o assunto mais prático: Qual o número ideal de pessoas por metro quadrado dentro de um ônibus ou trem? Qual deve ser a idade média e a idade máxima de uma frota? Qual deve ser o intervalo entre as partidas, de acordo com a demanda? Em quais condições climáticas regionais o ar-condicionado deve ser ou não obrigatório nos ônibus? Onde devem ser usados ônibus mais simples e robustos e onde podem ser aplicados ônibus com categoria melhor, de motorização traseira ou central?
Lotação é lotação no campo ou na cidade. Ônibus velho e inseguro é o mesmo no campo e na cidade.
Assim, deve ser aberta uma ampla discussão nacional, envolvendo passageiros, empresários, classe política, representações sociais, fabricantes e poder público, respeitando sim cada realidade regional, mas estipulando padrões mais claros e objetivos de operação e qualidade.
A falta de parâmetros tem prejudicado a todos inclusive na cobrança dos direitos.
Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes.

Comentários

Comentários

  1. vagligeirinho disse:

    Penso que metas devem ser estabelecidas a partir da base atual, e desta sempre superando. Uma escada.

    Não adianta botar uma meta para ser exigida de ser cumprida hoje, sendo que poucos podem cumpri-la. Isso acaba gerando apenas favorecimentos pessoais também e atendimento apenas de grupos que possam atender esta meta, e no final mante-la e até rebaixa-la. Isso também é gerar expectativas altas com frustrações rápidas.

    Um exemplo, já que citou: a capacidade de atendimento em lotações. O ideal é ter lotação mínima e sem inconveniências. Mas lembremos que são das lotações que vem muitas vezes a capacidade de lucro ou mínimo giro da empresa. E também a lotação é o indicativo de mobilidade em uma região, e isso vai além do fator transporte.

    Para eliminar as lotações inconvenientes (aquelas que dão umas 6 pessoas por m²), e o padrão de qualidade ser melhor (umas 2 a 3 pessoas por m²), tem que se fazer todo um trabalho na questão social (mudança de regiões de trabalho, etc…)

    O ideal para se iniciar a base de padrão de qualidade em transportes públicos de passageiros, basicamente, é:

    – Lotação máxima de 2 a 3 pessoas por m² (imagine um corredor de ônibus com 2 pessoas não tão grudadas).
    – Intervalo máximo entre veículos variando conforme a demanda de horário. Meta aceitável de 10 minutos (dependendo do fluxo de passageiros). Meta máxima de 20 minutos para regiões urbanas, 30 minutos para regiões remotas/rurais.
    – Atendimento pessoal respeitável e neutro.
    – Idade máxima variável dependendo do tipo de uso (transporte público concessionado, rodoviário/longa distância concessionado, fretado, escolar, etc…) manutenção do veículo, das mudanças de tecnologia (principalmente em relação à segurança) – este último pode aumentar a idade máxima se for tecnologias atuais como ABS e controle de estabilidade, da capacidade de investimento e dos custos envolvidos. Meta de idade máxima aceitável: 20 anos (ônibus rodoviários concessionados) e 30 anos (trens urbanos/regionais – ei! trens são feitos para durar! Com manutenção em dia, dura legal até 50 anos :) ).
    – Para empresas que atendem regiões rurais ou de pavimentação inexistente/péssima, o veículo pode perder em poucos aspectos de qualidade de detalhes (assentos plásticos ao invés de estofados, visual mais simples sem acabamentos) e ganhar em conforto de rodagem (suspensão voltada para serviços em estradas sem pavimentação, pneus específicos, controle de tração) e robustez (motor mais durável, proteções específicas, etc…) – Pensem nos veículos do “Caminhos da Escola”.

  2. Wilson Motizuki disse:

    Entre outros indicadores, acredito que colocar a idade máxima apenas, não diz nada, tem ônibus com 2 a 3 anos em péssimas condições de segurança e conforto e outros com mais de 10 anos me condições muito seguras, como são veículos que rodam muito, sem uma manutenção adequada, em poucos anos, as condições se deterioram rapidamente. Acredito que as empresas devam manter um número mínimo de quilometragem entre “falhas” (interrupções da operação do ônibus) índice muito conhecido no meio como “mkbf” e um outro índice semelhante em termos de acidentes, quilometragem entre acidentes.

  3. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa noite.

    Adamo, ótimo e oportuno editorial, Parabéns !

    No Brasil o que mais tem são leis e normas; tem lei e norma pra tudo, mas tudo mesmo.

    O problema é que o papel aceita tudo, então escrever é fácil.

    Não pode usar camisa polo azul toda sexta feira, conforme artigo 12 , parágrafo segundo
    da Lei 0000/00 de 00.00.0000.

    Simples não.

    Agora quero ver é fiscalizar na Praça da Sé, no Viaduto do chá ou em “Cururu do Brejo Preto”, se haverá um cidadão descumprindo tal norma ao usar uma camisa polo azul na sexta feira.

    O que o Brasil precisa é eliminar 90% da leis e das normas, porque para travar tudo falta pouco, muito pouco, pouquíssimo.

    Alguém duvida ????

    Basta aplicar o artigo 482 da CLT, “com pequenas alterações”.

    Art. 482 – Constituem justa causa para cassação, pelos contribuintes, do mandato de qualquer tipo ou cargo de políticos que não trabalharem, corretamente, com eficiência e eficácia.

    Não adianta fazer lei, politica de mobilidade e o “escambal”, se as barbaridades que sempre ocorrem, ainda continuarem a correr.

    O que tem de mudar é o modelo de gestão, só isso.

    Pintou “ciclotinta” com tinta imprópria = Justa Causa, não importa o nome, o partido ou o cargo e nada de delação premiada.

    Simples assim.

    Precisamos da gestão da FAZEDORIA DOS TRABALHOS CORRETOS.

    Att,

    Paulo Gil

    1. vagligeirinho disse:

      Leis existem, e fiscalização existe. Usando seu estilo de linguagem, digo: basta olhar-se no espelho e verá quem no final é o fiscal.

      Diz o ditado: “quem vigia os vigilantes”?

      Não precisamos de corregedoria, de mais e mais fiscais. Precisamos é NÓS fiscalizarmos com mais afinco. Cobrar olho-no-olho.

      Só que preferimos ficar aqui divagando na internet… ;)

  4. MARIO CUSTÓDIO disse:

    Boa noite ADAMO
    Entendo que o padrão de transporte público deve ser o da qualidade no atendimento aos olhos do freguês ou seja, o passageiro, aquele que toma o transporte coletivo que o deixará o mais próximo possível do local para onde se dirige.
    A questão com o Poder Público é que ele quer centralizar, controlar, dirigir, coordenar, enfim utilizar todas as funções da administração a seu favor e não a favor do passageiro.
    Vê-se claramente isso na tabela de horários de algumas linhas. Na disposição de um ponto de ônibus, na determinação de que tipo de carro deve a empresa ter, na pintura da companhia de ônibus, agindo como se os empresários e os passageiros não tivessem mente suficiente para conversar e determinar o que é melhor pra si e para outrem.
    Sou pelo controle do sistema pelo gestor público, porém pelo controle para verificar se o que foi contratado está sendo assegurado e não como controlador total do sistema, como aliás é preconizado no Livro 1984, escrito por Orwell. Controles são necessários. Confundir operação com controle não. Hoje há uma baita confusão entre quem opera e quem controla. Em várias regiões do Brasil o passageiro não sabe muito bem quem é o operador e quem é o gestor do sistema, pois a padronização excessiva de cores e desenhos leva a isso. É necessário dar mais liberdade para os operadores operarem e para os passageiros opinarem. Isso é democrático. Socializar demais o transporte leva ao caos. Deixar cada um operar ao seu gosto também. Portanto, o controle deve ser do gestor e a operação deve ser do operador. E todos conversando, gestor público, operador e passageiro, em prol de um sistema de transporte com alta qualidade.
    Saudações,
    MARIO CUSTÓDIO

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