NÃO BASTA CRIAR, É PRECISO CONSERVAR

Rogerio Fornaza

Rogério Fornaza pode ser considerado um dos novos heróis da ferrovia. Com a falha do sistema anticolisão do Metrô da linha 3 Vermelha de São Paulo, ele teve perícia e profissionalismo ao frear a composição e evitar que a batida entre os trens da linha mais movimentada de São Paulo se tornasse uma tragédia. Não basta inaugurar linhas, é necessário investir constantemente em melhorias das já existentes. Frente a essa necessidade, para demandas médias é mais prudente apostar em modais já conhecidos e de implantação e manutenção mais baratas como corredores de ônibus. Além da expansão do Metrô, a região metropolitana tem a necessidade de mais corredores intermunicipais. O erro de muitos responsáveis e especialistas em mobilidade é encarar corredores só como estruturas que servem internamente as cidades. Foto: Reprodução TV Globo.

Não basta ampliar, é necessário conservar
Investimentos na linha 3 Vermelha do Metrô, que foi palco de um grave acidente, tiveram queda entre 2010 e 2011. Será que o Governo terá fôlego para conservar os novos empreendimentos anunciados?

ADAMO BAZANI – CBN

A região metropolitana de São Paulo precisa de ampliação na oferta e na qualidade dos transportes públicos. A frase é tão obvia como dizer que a água em seu estado líquido molha.
Não adianta apenas investir nos transportes pensando na cidade de São Paulo apenas, mas em toda a região metropolitana, já que pelo crescimento urbano, a interdependência entre as cidades e a circulação de pessoas de um município e outro são cada vez maiores.
Também outra constatação óbvia.
Sendo assim, todo os investimentos nos modais corretos para cada área, levando em conta suas características geográficas e de demanda, são na verdade recuperar o atraso em mobilidade de décadas. A economia cresceu, o número de pessoas cresceu, as necessidades de deslocamentos também, mas a malha de transportes não acompanhou estes movimentos, que na verdade, não eram novidades para ninguém. Há muito tempo, a cidade dava ares de se tornar metrópole.
Remetendo à história, as médias e grandes cidades já buscavam soluções que mesclassem o transporte por trilhos e pneus com maior capacidade. Nos anos de 1950, surgiu a emblemática figura do Papa-Fila, um cavalo de caminhão que tracionava uma enorme carroceria para passageiros. Era uma espécie de precursor do ônibus articulado e servia linhas de movimento maior.
Mas ao mesmo tempo, nesta época, a indústria automobilística crescia e o culto ao transporte individual não era uma paixão que nascia no brasileiro, mas uma bem engenhada jogadas de marketing em busca da afixação do poder econômico das indústrias do setor que, de tão fortes, conseguiam sim manipular as decisões de políticas públicas.
Atribuir, no entanto, só a este fato o descaso pelo qual os transportes coletivos sofreram, é minimizar os problemas.
Acrescenta-se a isso fatores como a falta de coragem dos responsáveis por gerirem as cidades e à própria característica da política brasileira de governar sempre para a turminha, “para os meus”, para minha classe, para a patota, para os companheiros que estão no poder.
Sempre esses tiveram carro, então, investir no transporte individual, em vias que logicamente iam se congestionar, era aplicar no próprio bem estar de quem sempre esteve a frente do poder, independentemente da cor da bandeira..
Atualmente, quando o Governo do Estado de São Paulo anuncia uma série de planos de expansão do metrô é alentador. Realmente, a região metropolitana precisa de oferta de transporte de grande capacidade.
Mas ao mesmo tempo, dois aspectos são deixados de lado: a necessidade de investimento em modais de média capacidade, de caráter metropolitano, e um plano não só para a criação de novas linhas, mas de sua correta manutenção e investimento em melhoria.
O primeiro aspecto é a ausência de projetos de corredores de ônibus do tipo BRT – Bus Rapid Transit – que liguem cidades diferentes.
Já é de conhecimento de todos que um corredor de ônibus é mais barato, mais simples de ser feito e com as características de BRT, mais modernos, oferecem agilidade e conforto que não ficam atrás de opções ferroviárias.
Não se trata de cultivar a medíocre briga entre os defensores dos trilhos e dos pneus. Mas de despertar para um erro que até especialistas em mobilidade têm cometido: taxar os corredores de ônibus como soluções apenas para os transportes internos nas cidades e os meios ferroviários apenas para os fins metropolitanos.
Há em São Paulo um exemplo, aliás, infelizmente um apenas, de corredor de ônibus que liga cidades diferentes. Trata-se do corredor ABD, que une a Zona Sul à Zona Leste de São Paulo, pelas cidades de Santo André, Mauá, São Bernardo do Campo e Diadema.
Com ônibus e trólebus, veículos elétricos não poluentes, a operadora Metra transporta cerca de 7,5 milhões de passageiros por mês e recebeu aprovação de 79% dos passageiros, de acordo com pesquisa da Associação Nacional dos Transportes Públicos sobre a imagem dos transportes da Grande São Paulo.
Numa mesma cidade, é possível ter ligação intermunicipal por ferrovia e corredor de ônibus ao mesmo tempo. Exemplo é Santo André, no ABC Paulista, que é servida pelo corredor da Metra e pela linha 10 Turquesa da CPTM – Companhia de Trens Metropolitanos.
Santo André faz limite com diversas cidades e com a Capital Paulista faz mais de um limite.
O metrô de fato deve se “intermunicipalizar”, mas os corredores de ônibus também.
O corredor de ônibus é bem mais barato e fácil de manter e pode atender as demandas que ele comporta.
Este aspecto leva para um segundo ponto: é louvável a expansão do Metrô em São Paulo. Louvável e necessária. Mas não basta criar linhas novas, deve-se investir constantemente na melhoria das que já existem.
Na semana passada chamou muito a atenção da opinião pública o acidente na linha 3 vermelha do Metrô, a mais movimentada do sistema, entra as estações Carrão e Penha,na zona Leste de São Paulo.
O acidente, causado pela falha do sistema que mantém a distância entre os trens, só não se tornou uma tragédia graças a perícia do condutor da composição que vinha atrás do trem que estava parado, Rogério Fornaza, de 29 anos, que mesmo com o sistema indicando de maneira errada que a composição poderia seguir com velocidade maior, freou minimizando o choque.
Dados divulgados pela Folha de São Paulo indicam que os investimentos do Metrô em melhorias na linha 3 Vermelha, justamente onde ocorreu o acidente caíram de 2010 para 2011, 20,4%, passando de R$ 236,2 milhões para R$ 188 milhões.
Enquanto o metrô e os trens avançam por um lado, por outro retrocedem.
Só neste ano foram quase 100 falhas significativas nos serviços que atrapalharam a vida de milhões de passageiros foram registradas nos trilhos.
O Governador Geraldo Alckmin se orgulha em dizer que a demanda do metrô tem aumentado por que as pessoas têm deixado os ônibus para irem nos serviços de trilhos.
Será que isso é motivo de orgulho? Não seria mais orgulho dizer que mais pessoas deixaram os carros em casa e foram tanto para o metrô como para o ônibus em corredores de qualidade?
Afinal, todos são unânimes em dizer que metrô e ônibus devem se complementar e não tirar passageiros um do outro sobrecarregando os sistemas.
O presidente do Metrô Peter Walker mostrou entender essa lógica ao dizer que as linhas de metrô devem ser desafogadas por corredores de ônibus rápidos e expressos, que reduzem a lotação em estações já saturadas pelas baldeações que parecem só ser planejadas em determinados pontos que não suportam mais tanta gente.
Tais corredores ligariam estações de diferentes linhas de metrô e evitariam a sobrecarga nestes pontos de baldeação demasiadamente lotados.
Assim, é mais que necessário o Governo do Estado investir na expansão dos transportes, mas também deve cuidar do que já está implantado.
Inaugurar linhas e estações é muito bom politicamente e para a população. Mas não é só inaugurar, tem de cuidar, algo básico.
Em muitas falhas, o metrô e a CPTM dizem que a causa foi humana. Mas falha humana também revela falta de investimento adequado. Afinal, os condutores e demais funcionários das ferrovias devem ser constantemente capacitados.
Hoje, surgem várias soluções novas para o País com custos altos para atendimento de médias demandas.
MAS FICA A PERGUNTA: Diante da necessidade de expansão e manutenção, frente a recursos que são limitados e devem ser usados com respeito, para médias demandas, não seria mais prudente o investimento em modais que são mais baratos para construir e manter e que dão conta do recado?
Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes.

Comentários

Comentários

  1. Pedro disse:

    Adamo, e a Sptrans esta com plano de mudar mais uma linha 3139-10 (Vila Formosa – Pça João mendes), jogando esta linha para o Metro Bresser, o que está ruim vai ficando pior, e quase como se ela encerrace as atividades desta linha, a muito tempo venho falando que a Sptrans precisa urgentimente de uma CPI, principalmente na zona leste.

  2. Gustavo Cunha disse:

    Bom dia.

    Sempre importante e interessante, o tema desta reportagem. É simples, mais fácil e mais barato, fazer aquilo que é possível, neste momento, mas, nem sempre fazer o certo é o certo a fazer, na ótica de alguns.

    Abraço.

  3. Bruno Quintiliano disse:

    É mais simples, barato e fácil, mas não dá tanta visibilidade nas propagandas. Falam da SPTrans, mas ela tem que se submeter aos desmandos de uma gestão que não dá a mínima para os transportes públicos.

    1. Bruno Quintiliano disse:

      Basta ver o que aconteceu com o interligado.

  4. Luiz Vilela disse:

    Se a SPTRANS oferecesse um serviço de qualidade, que recebesse mais de 75% de aprovação dos usuários, teria mais visibilidade nas propagandas.

    Existe um ponto a partir do qual um serviço obtém reconhecimento, ao invés de apenas receber críticas e cobranças. É o caso dos corredores e estações-tubo. Nem precisa dizer onde, certo?

    Se serviço mais caro agradasse sempre, todos elogiariam a ponte aérea Sampa-Rio.

  5. Nathallia Pedrosa disse:

    sera se a população quer onibus mesmo???
    com 20 dis de operação,onibus com ar condicionado,mas a população quer que as janelas fiquem abertas,não aceitam o sistema de ar condicionado,com apenas 20 dias de operação o onibus todo pixado,banco rasgado,é isso que a população quer,feliz por estar de acordo com as normas da SPTRANS mas triste pelo vandalismo.

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