OPINIÃO: Fácil de explicar e simples de entender

Foto: Alexandre Pelegi

FRANCISCO CHRISTOVAM

No último dia 5 de fevereiro, a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes – SMT e a São Paulo Transporte S/A – SPTrans, depois de um esforço enorme para superar todos os entraves, conseguiram realizar a sessão pública destinada a receber as propostas das empresas interessadas na “delegação, por concessão, da prestação e exploração do serviço de transporte coletivo público de passageiros, na cidade de São Paulo”.

Passadas as fases de preparação do processo licitatório e suplantadas as questões e exigências levantadas pelo Tribunal de Contas do Município, o edital de licitação foi, no final de novembro do ano passado, finalmente publicado e colocado à disposição das empresas interessadas em participar do certame.

Ao mesmo tempo em que os técnicos finalizavam os estudos e preparavam os documentos do edital, autoridades municipais, responsáveis pela área dos transportes, à época, visitavam várias capitais e cidades de grande porte, realizando palestras e oferecendo, a quem pudesse interessar, a oportunidade de participação no processo licitatório. Como essa licitação vem sendo exaustivamente discutida, ao longo dos últimos cinco anos, é muito difícil imaginar que ela não tivesse se tornado de amplo conhecimento de quase todas as empresas operadoras de transporte por ônibus, no Brasil e no exterior.

O processo para a contratação das empresas que deverão explorar os serviços de transportes por ônibus foi dividido em três grandes licitações, separadas e concomitantes, sendo uma para o Grupo Estrutural, com nove lotes, outra para o Grupo Local de Articulação Regional, com dez lotes, e, mais uma, para o Grupo Local de Distribuição, com treze lotes de serviços. Após a fase de transição, que deverá durar 48 meses, a cidade deverá contar com uma frota operacional de 13 mil ônibus, operando em cerca de 1.200 linhas.

Na data de entrega da documentação, 33 empresas operadoras ofereceram propostas para os 32 lotes que compõem os três Grupos, ou seja, em apenas um lote houve a apresentação de duas propostas.

Para quem não conhece o sistema de transporte por ônibus de São Paulo, a primeira impressão que ficou foi que, de fato, não houve renovação das empresas operadoras e tampouco concorrência, fazendo com que a Municipalidade não pudesse contar com uma verdadeira competição entre as empresas interessadas. Ledo engano!

Os nove lotes do Grupo Estrutural e os dez lotes do Grupo de Articulação Regional, com uma frota patrimonial de 4.171 e de 3.727 ônibus, respectivamente, deverão ser disputados por empresas que já operam veículos de grande capacidade. Por sua vez, empresas que foram constituídas nos últimos cinco anos, todas provenientes das antigas cooperativas de transportes que operavam sob o regime de permissão, concorrem pela operação dos treze lotes do Grupo de Distribuição, com uma frota de 6.134 ônibus de menor porte. Cabe destacar que o número de veículos do Grupo de Distribuição representa 44% da frota total a ser alocada na prestação dos serviços e a Transwolff Transporte e Turismo Ltda. e o Consórcio Transnoroeste, com frotas de 1.349 e 1.309 ônibus, respectivamente, serão a segunda e terceira maiores empresas do sistema.

Ao se analisar as condições específicas e as exigências constantes do edital de licitação é possível verificar, de imediato, que operar serviços de transporte por ônibus em São Paulo não é tarefa para iniciantes e nem, muito menos, para amadores. Se, de um lado, a valor presente, o montante total dos contratos, de cerca de R$ 71 bilhões, parece interessante e tentador, é preciso considerar os investimentos previstos, da ordem de R$ 11 bilhões, bem como despesas gerais e custos operacionais, estimados em R$ 56,5 bilhões, a serem dispendidos ao longo do período da concessão.

Pode-se afirmar, sem medo de errar, que existem bem poucas empresas, nacionais ou internacionais, que aceitariam o desafio de transportar, diariamente, quase seis milhões de pessoas, que realizam cerca de nove milhões de viagens, em condições totalmente adversas. Infelizmente, em São Paulo, os ônibus ainda têm pouquíssima prioridade de circulação e disputam o espaço viário com automóveis, motocicletas, bicicletas e caminhões de entrega. Além disso, as empresas são sistematicamente multadas, quando não conseguem cumprir as partidas e realizar as viagens programadas, conforme especificado pelo Poder Concedente, mesmo se os ônibus ficarem retidos nos congestionamentos. É preciso registrar que as empresas operam linhas e frotas em estrito cumprimento às Ordens de Serviço de Operação – OSO’s, estabelecidas pela SPTrans, com um nível muito baixo de flexibilidade ou possibilidade de ajustes operacionais.

No que se refere ao custo de operação do sistema, calculado com base numa planilha técnica, que leva em conta critérios e conceitos de economia e de engenharia, vale lembrar que ele também é absolutamente parametrizado, ou seja, a SPTrans especifica o tipo de veículo e a quantidade de ônibus que deve operar em cada linha. A partir daí, os custos de pessoal, depreciação, combustíveis, lubrificantes, pneus e peças de reposição se tornam simples função da frota utilizada. Em resumo, praticamente, não há margem para racionalizações, reduções de custos e de despesas e grandes economias.

Antes de questionar os resultados do processo licitatório e de adjetivar as atuais empresas operadoras que, às duras penas, tentam realizar o transporte por ônibus com um mínimo de qualidade, há que se discutir as condições da infraestrutura disponível para a execução dos serviços. É preciso investir, urgentemente, na construção de novos corredores e faixas exclusivas, na ampliação e reforma dos terminais de transferência, na melhoria das condições de embarque e desembarque, na preferência para os ônibus nos cruzamentos, entre outros.

Sem investimento pesado na infraestrutura, no sistema de controle e monitoramento da frota e no sistema de comunicação com os passageiros, não há como produzir transporte em quantidade e qualidade suficientes e adequadas às necessidades da população, seja com novas ou com velhas empresas.

Diante de tanta complexidade, fica claro que comentários desabonadores, conceitos ultrapassados, frases feitas, números equivocados e opiniões absolutamente fora do contexto, só mostram falta de conhecimento da realidade ou tentativa gratuita de macular a imagem das empresas e do próprio serviço de transporte por ônibus da 5ª maior cidade do mundo.

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(*) Francisco Christovam é presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo – SPUrbanuss. É, também, vice-presidente da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo – FETPESP e da Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP e membro do Conselho Diretor da Associação Nacional de Empresas de Transportes Urbanos – NTU.

Comentários

Comentários

  1. Bruno Quintiliano disse:

    Quase comoveu. Mas cadê as empresas profissionais? Essas com ônibus quebrando no caminho e intervalos enormes representadas pelo autor é que não são. Ou que colocam ônibus reservado como se estivesse rodando, pra enganar quem está olhando pelos apps. Partidas descumpridas depois das 22, em sábados e domingos, mesmo quando não há congestionamentos, mas que misteriosamente passam a conseguir cumprir mesmo sem a prioridade (importante sim), após encher o site da prefeitura de reclamações.
    Além disso, nao adianta divulgar por aí, se a vendedora teria que possuir garagem e frota para iniciar a operação em 120 dias após a assinatura, como se fosse só dar um pulinho na concessionária e sair dirigindo o ônibus de lá, pra comecar a rodar.
    A Raquel rolnik fez uma análise bem interessante sobre a licitação
    https://raquelrolnik.blogosfera.uol.com.br/2019/02/06/o-novo-e-o-velho-na-licitacao-dos-onibus-em-sao-paulo/

    1. Paulo Gil disse:

      Bruno Quintiliano, boa noite.

      Valeu a indicação do link; muito oportuno e legal.

      Abçs,

      Paulo Gil

  2. JOSE LUIZ VILLAR COEDO disse:

    A PREFEITURA DE SP/SP EXIGE MUITO E FAZ BEM POUCO PELAS EMPRESAS DE ÔNIBUS TRADICIONAIS E ESSAS MAIS NOVAS QUE SURGIRAM DA EX COOPERTATIVAS!GRANDES AVENIDAS ESBURACADAS, CARROS PARTICULARES DISPUTANDO ESPAÇO COM ÔNIBUS E AINDA MAL ESTACIONADOS ATRAPALHANDO A VIAGEM DOS PASSAGEIROS… RUAS ESTREITAS E ESBURACADAS AONDE SÃO OBRIGADOS A PASSAREM ÔNIBUS CONVENCIONAIS NOVOS … QUANDO A RUA É ÓTIMA PRA MICRO-ÔNIBUS E MICROES … TRISTE É VER A AUSÊNCIA DA CET EM CONJUNTO COM A SPTrans TRABALHANDO DURO PRA DESOBSTRUIR TRÂNSITO E MULTAR SEM DO OS FOLGADOS QUE ATRAPALHAM OS ÔNIBUS! E O ASFALTAMENTO / REACAPEAMENTO DE RUAS E AVENIDAS… MISERICÓRDIA ! ENFIM… A PREFEITURA COBRA MUITO E NÃO DA QUASE NADA EM TROCA! QUE ADIANTA POR EXEMPLO COLOCAR VEÍCULOS NOVOS… SE NEM O CALÇAMENTO DAS RUAS COLABORA PARA A MELHORIA DOS SERVIÇOS DE TRANSPORTES ?! E CADÊ OS CORREDORES REALMENTE EXCLUSIVOS???

  3. Rodrigo Zika! disse:

    O assunto e bastante controverso, mesmo que não seja qualquer empresa de porte grande, que possa operar na cidade, existem diversas que teriam possibilidade, o problema e o monopólio descarado que a própria SPTrans finge não existir, o chassis e encarroçadora e o exemplo maior que tem, se uma empresa de outro estado que prefira por exemplo um Marcopolo, já teria dificuldade, talvez não por ser aprovado e sim quanto ao custo da manutenção e rodagem, em contar que podem ser reprovados pela SPTrans, a exemplo do Volvo de 21 metros reprovado o ano passado, porque sera né, então fica difíci algum empresa arriscar, seja pelo lobby pilantra, ou pela pressão em cima de prefeitos e SPTrans, pra fingir que nada acontece, uma vergonha.

  4. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa noite.

    Preliminarmente, deve ser observado o quanto disposto no artigo 5º-IV da Constituição Federal / 1988.

    IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

    Se as empresas de buzão têm “conhecimento e expertise”; como se explica?

    – Buzão com:

    – Goteira;

    – Sujeira interna geral;

    – Bancos quebrados;

    – Entradas de ar no teto quebradas ou emperradas;

    – Saídas de ar condicionado todas pretas (será que trocaram o filtro?)

    – Carro bota (8019 x 8705 ou 8705 x 8019);

    – Linhas com mais de 50 anos (ex. 8705);

    – Itinerários ziguezagueados – exemplo 477-P (https://www.onilinhas.com.br/sao-paulo/itinerario/linha-477P/) e caranguejados (linhas que andam para trás – exemplo 809-H) https://www.onilinhas.com.br/sao-paulo/itinerario/linha-809H/

    [Acessem os sites e confiram]

    – 6 anos para fazer uma licitação;

    – Congestionamento de buzão nos Corredores Rebouças e 9 de Julho;

    – Articuladinho trucadinho batendo lata aos sábados no corredor 9 de Julho;

    – Linhas circulares SEM embarque no Terminal Butantã, devendo o usuário andar no mínimo 800 metros para chegar ao ponto mais próximo, sendo que a linha circular passa dentro do Terminal Butantã.

    – E tantos outros problemas.

    Diante dos itens supracitados, quem será que macula a imagem e os serviços das empresas “detentoras de conhecimento e expertise” ?

    Num futuro “quase próximo” ainda terá um “paralelepípedo” a ser digerido pela SMT (e empresas) no decorrer deste processo de licitação, conforme abaixo.

    “O conselheiro, entretanto, diz que a SMT – Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes deve explicar questões pontuais nos editais de licitação. O mérito sobre se a concorrência atende a todas as determinações do TCM ainda vai ser julgado até a homologação dos contratos.”

    Conforme informado no Diário de Transporte na matéria disponível em:https://diariodotransporte.com.br/2019/02/08/suposta-empresa-fantasma-de-onibus-que-funciona-em-barbearia-tambem-tentou-barrar-licitacao-dos-onibus-de-sao-paulo-no-tcm/

    Se ainda existe questões pontuais nos editais de licitação a ser explicadas, é porque o mesmo ainda não está 100%, apesar de já ter sido publicado e recebido os envelopes com 9000 páginas (insano); portanto…

    Lembrando que o Barsil, no momento, não tem condições de investir pesado em infra estrutura, tem de primeiro acabar com o desperdício do dinheiro do Contribuinte.

    “FÁCIL DE EXPLICAR E SIMPLES DE ENTENDER”, mas difícil é suportar a PMSP aceitar a qualidade dos serviços prestados com tantos impostos que os contribuintes pagam e o alto valor da tarifa em função da média dos salários em Sampa.

    Att,

    Paulo Gil

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