Sem planilha transparente, Niterói não revê tarifa das linhas municipais desde 2012

Foto: Divulgação

Revisão está prevista em contrato, mas segue ignorada pela Prefeitura, que promete divulgar em janeiro estudo que reavalia custo da passagem dos ônibus municipais

ALEXANDRE PELEGI

Os contratos de concessão de ônibus no Brasil seguem sendo, em boa parte, um instrumento sem muito valor quando o assunto se refere a revelar com clareza os custos que compõem o valor final da tarifa cobrada do passageiro. Em poucas palavras, falta transparência para o sistema.

É o caso de Niterói, município da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, onde o contrato de concessão dos ônibus, assinado em julho de 2012 e que prevê a revisão da tarifa das linhas municipais, jamais foi seguido.

Pelo contrato, a primeira revisão tarifária deveria ocorrer um ano após o primeiro reajuste, concedido em junho de 2013. Em seguida, observa o texto do contrato, dois anos após a vigência da tarifa revisada, novo processo de revisão deveria ser realizado. Em resumo, a reavaliação de tarifa, atualmente em R$ 3,90, deveria ter ocorrido pelo menos duas vezes até hoje.

Esta revisão poderia ocasionar, inclusive, uma redução no valor pago pelos passageiros do sistema. Algumas iniciativas das três instâncias de poder executivo podem ter gerado benefícios que impactaram beneficamente nos custos operacionais das empresas, ao reduzirem os custos do setor de transportes. Menores custos significariam tarifas mais baratas.

Enquanto falta transparência sobre os dados do sistema de transporte coletivo, o que leva a muitas críticas sobre a “caixa preta” dos custos do setor, a prefeitura de Niterói se defende afirmando que divulgará um estudo em janeiro de 2018.

INCIATIVAS E BENEFÍCIOS QUE PODERIAM JOGAR O PREÇO DA TARIFA PARA BAIXO

Dentre as iniciativas que beneficiaram o sistema de transporte coletivo, e desta forma poderiam reduzir custos que impactam no cálculo tarifário, estão, por exemplo, a criação de faixas exclusivas nos corredores viários mais importantes da cidade. A ação da Prefeitura diminuiu o tempo das viagens.

Esta ação, feita para aumentar a eficiência do sistema, traz como consequência a redução nas despesas das empresas de ônibus. Graças às faixas exclusivas, há um aumento visível na velocidade dos ônibus, o que redunda numa menor quantidade de veículos para operar a mesma linha, já que a empresa pode realizar mais viagens com os mesmos ônibus. Isso ainda, em última instância, poderia até mesmo diminuir a folha de pagamento, ao reduzir a quantidade de pessoal empregado necessária para operar as linhas.

Por parte do governo do estado houve um benefício fiscal importante: a redução das alíquotas do IPVA e do ICMS que incidiam sobre o serviço.

O governo federal também zerou a cobrança de PIS e Cofins para as empresas de transporte público.

CRISE E AÇÕES DA ÁREA ECONÔMICA DA UNIÃO PODERIAM JUSTIFICAR PREÇO MAIOR DA TARIFA

Evidente que outros custos precisam ser observados, como os que impactam negativamente nos gastos das empresas de ônibus.

É o caso do preço do diesel, parte importante nos custos variáveis das empresas – combustível, rodagem, peças e acessórios -, que passou a subir acima da inflação após a nova política de reajustes da Petrobrás.

Há que se verificar, também, os efeitos da crise econômica, que reduziram os passageiros pagantes no sistema, conforme vários estudos vêm demonstrando. O presidente da SPUrbanuss, Francisco Christovam, lembra que “a qualidade dos serviços prestados, nos padrões exigidos pelas municipalidades, depende da capacidade de pagamento dos passageiros e da disponibilidade de recursos a serem aportados, a título de subsídio, pelas prefeituras”.

Onde não há subsídio da prefeitura, o preço do serviço tem de ser sustentado por quem paga a tarifa. Se há evasão na receita (os pula-catracas, fraudes nas gratuidades, etc), ou excesso de benefícios para não-pagantes, as contas não fecham.

Em resumo, somente com transparência nos dados públicos é possível avaliar o impacto positivo e negativo de medidas na tarifa, assim como de efeitos conjunturais.

Nesse sentido, desde meados de 2014, a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos – NTU, em conjunto com a Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP, passaram a desenvolver estudos de uma nova planilha de custos, cujo objetivo foi calcular o custo da produção dos serviços, com foco na transparência. A planilha foi finalmente lançada no dia 21 de agosto de 2017, e já servirá como metodologia a ser observada na licitação dos transportes da cidade de São Paulo, segundo informou o secretário municipal de Mobilidade e Transporte de São Paulo, Sergio Avelleda, logo no dia seguinte ao lançamento. Ela está disponível para download no site da ANTP, no link: http://www.antp.org.br/planilha-tarifaria-custos-do-servico-onibus/apresentacao.html

Em entrevista ao jornalista Adamo Bazani, concedida no dia 8 de novembro de 2017, o superintendente da Agência Nacional de Transportes Públicos -ANTP, Luiz Carlos Mantovani Néspoli, afirmou que “hoje a maior parte das cidades brasileiras se baseia num modelo de planilha de tarifa desatualizado, que foi elaborado em 1983 e teve a última revisão em 1996. Como houve mudanças nos sistemas de transportes, este modelo pode trazer distorções e embutir custos, que a sociedade paga e não entende. É necessária maior transparência”.

Néspoli explica ainda:

“O modelo de planilha usado atualmente na maior parte das cidades não separa de maneira clara, a remuneração sobre o capital imobilizado (os investimentos nos ônibus, por exemplo) e o que é lucro do empresário. A sociedade e o poder público pagam às vezes sem saber o que realmente estão pagando”.

Relembre a entrevista:

https://diariodotransporte.com.br/2017/11/09/entrevista-nova-planilha-de-calculo-de-tarifas-de-transporte-publico-sera-explicada-a-prefeitos-e-secretarios-de-todo-o-pais/

PREFEITURA DE NITERÓI PROMETE ESTUDO PARA JANEIRO DE 2018

O último estudo tarifário de Niterói, apresentado antes da assinatura do contrato de concessão, precisa ser revisto aos custos da época. O que precisa ocorrer, afirma especialistas, é que a Prefeitura precisa adotar uma postura de transparência nos dados.

A administração municipal garantiu em nota que vai apresentar o resultado da revisão tarifária. Pela nota, a prefeitura afirma que o levantamento está em andamento e “seu resultado será divulgado em janeiro (2018)”.

A nota da gestão municipal reforça que os reajustes até hoje seguiram o contrato de concessão, ou seja, foram “baseados na inflação”.

Para complicar a equação, as empresas que operam o transporte coletivo de Niterói, à semelhança das empresas do Rio de Janeiro, não cumpriram a meta estipulada para a climatização dos veículos, estabelecida em decreto municipal de 2015.

Pelo decreto, a climatização deveria atingir 90% da frota até dezembro de 2016. O Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários (Setrerj) admite, no entanto, que 75% dos cerca de 800 ônibus de Niterói possuem aparelhos de ar-condicionado.

O Setrerj afirma, no entanto, que a meta e climatizar a frota não consta do contrato de concessão, e além disso as empresas tiveram dificuldades em 2017 por conta da crise econômica e da contração de financiamentos.

Alexandre Pelegi, jornalista especializado em transporte

Comentários

Comentários

  1. Espaço dos Rodoviários disse:

    Ministério Público deve inverstigar ou acompanhar o lançamento do resultado da revisão tarifária prometido pela Prefeitura em janeiro de 2018.

Deixe uma resposta

Descubra mais sobre Diário do Transporte

Assine agora mesmo para continuar lendo e ter acesso ao arquivo completo.

Continue reading