ENTREVISTA: Nova planilha de cálculo de tarifas de transporte público será explicada a prefeitos e secretários de todo o País

Segundo ANTP, que elaborou o modelo, custos dos sistemas devem ficar mais transparentes, evitando eventuais “caixas-pretas” dos transportes

ADAMO BAZANI

Não é de hoje que, principalmente em época de reajuste das tarifas de transportes públicos, volta à tona o termo “caixa-preta das empresas de ônibus”.

A expressão virou um jargão em entrevistas e discursos políticos em ocasiões, por exemplo, como das manifestações contra os aumentos das tarifas em julho de 2013, que mobilizaram milhões de pessoas em todo o País.

Em diversas cidades e regiões metropolitanas, CPIs – Comissões Parlamentares de Inquérito, auditorias, verificações independentes e até investigações de ministérios públicos tentaram achar as tais “caixas-pretas” e não conseguiram.  Os motivos para as frustações destas apurações vão desde a simples inexistência das irregularidades que estavam sob suspeita até a incapacidade técnica de os agentes de investigação e apuração entenderem os complexos e defasados modelos tarifários usados no país.

“Hoje a maior parte das cidades brasileiras se baseia num modelo de planilha de tarifa desatualizado, que foi elaborado em 1983 e teve a última revisão em 1996. Como houve mudanças nos sistemas de transportes, este modelo pode trazer distorções e embutir custos, que a sociedade paga e não entende. É necessário maior transparência” – disse em entrevista ao Diário do Transporte, o superintendente da Agência Nacional de Transportes Públicos -ANTP, Luiz Carlos Mantovani Néspoli, nesta quarta-feira, 08 de novembro de 2017.

A associação atualizou a planilha antiga, do Geipot – Grupo Executivo de Integração da Política de Transportes, hoje Empresa Brasileira de Planejamento de Transporte, e apresentou um novo modelo considerado pelos seus técnicos, mais transparente. O lançamento da planilha teve cobertura do Diário do Transporte, em 21 de agosto deste ano. Relembre: https://diariodotransporte.com.br/2017/08/21/cidades-brasileiras-devem-adotar-nova-planilha-de-tarifas-de-onibus-que-preve-custos-maiores/

Agora, após o lançamento oficial, os técnicos da ANTP estão colocando os pés na estrada e mostrando, em forma de workshops, para prefeitos, secretários de transportes, responsáveis por gerenciadoras públicas e empresários de ônibus, como a nova planilha pode ser usada para os respectivos sistemas locais de mobilidade.

O primeiro encontro ocorreu em Teresina, nos dias 25 e 26 de outubro, reunindo o prefeito Firmino Soares Filho (que participou da primeira atividade), membros da Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito –Strans e empresas de ônibus.

“A recepção foi muito boa e foi possível discutir o novo modelo de planilha de transportes que pode ser adaptado à realidade de qualquer município, inclusive para Teresina. O que mais agradou a todos os participantes foi a possibilidade de oferecer mais transparência para todos” – relatou Néspoli.

A ANTP deve apresentar o modelo de tarifa no Fórum Nacional dos Secretários, que vai ser realizado nos dias 27 e 28 deste mês, em Recife.

“O modelo de planilha usado atualmente na maior parte das cidades não separa de maneira clara, a remuneração sobre o capital imobilizado (os investimentos nos ônibus, por exemplo) e o que é lucro do empresário. A sociedade e o poder público pagam às vezes sem saber o que realmente estão pagando” – exemplifica.

Para Néspoli, em boa parte dos sistemas de transportes, não há técnicos do poder público concedente dos serviços capazes de identificar os reais custos da prestação de serviços.

“O empresário de ônibus tem o controle de seu negócio, mas nem todas as cidades possuem corpos técnicos suficientemente bons e entendidos para estabelecer os custos, uma tarifa justa e uma remuneração justa aos operadores de transportes” – disse.

Ainda sobre o exemplo de os atuais modelos tarifários não separarem de maneira transparente custos, investimentos e lucros, o superintendente da ANTP citou a remuneração sobre capital imobilizado, a remuneração da prestação de serviço em si e a depreciação da frota.

A remuneração sobre o capital imobilizado é como se fosse, de acordo com as regras de mercado vigentes em cada época, o retorno pela opção do investimento da compra dos ônibus e de outros bens para a atividade de transporte.

Isso não é visto como lucro, mas um retorno do investimento ao longo do tempo. É como se a pessoa em vez de investir em poupança ou aplicações bancárias, por exemplo, investiu no capital ônibus.

A remuneração sobre o capital imobilizado é diferente também da depreciação da frota. A depreciação consiste na recomposição do valor do ônibus. A depreciação, em tese, não pode dar lucro para o empresário e não pode deixar que ele assuma a desvalorização do ônibus. No final do ciclo da vida útil estipulado pelo poder concedente, a conta tem de zerar.

O lucro vem da prestação de serviços de transportes.

A planilha, entretanto, pode identificar custos maiores que devem interferir num aumento do valor da tarifa de remuneração (não necessariamente a tarifa paga pelo passageiro na catraca), resultando em necessidade de estabelecer valores de subsídios.

Por exemplo, foram relacionados 17 riscos inerentes ao negócio dos transportes que devem compor a tarifa. Estes riscos têm um peso de acordo com cada sistema e vão desde a perda de passageiros pelas empresas de ônibus decorrente da migração para outros meios de transporte público até incêndio a ônibus em ataques, veículos que não têm seguros. Cada município deve ponderar as possibilidades estatísticas destes riscos ocorrerem. Se, por ventura, estes riscos não acontecerem, o empresário acaba “ganhando” esta remuneração. Entretanto, para evitar “lucro nos riscos” as possibilidades devem ser equilibradas.

Na nova planilha, alguns custos novos serão contabilizados, como ônibus mais tecnológicos, sistemas de CCO e bilhetagem eletrônica.

Entretanto, para que haja justiça na remuneração das empresas, também é necessário calcular os ganhos e economias que estas tecnologias devem trazer ao empresário e ao sistema como um todo ao longo do contrato.

Por exemplo, um ônibus moderno pode ser mais caro e de manutenção mais complexa, mas gasta menos combustível.

Um CCO requer investimento em sua implantação, mas ao controlar melhor a frota e as partidas, uma empresa de ônibus e um sistema como um todo podem economizar dinheiro.

Os equipamentos de bilhetagem eletrônica têm seu custo, mas quando o cobrador é retirado por causa deste investimento, fazendo a empresa de ônibus economizar salário, este dado deve ser considerado na remuneração também.

“A grande vantagem da transparência é que todos podem acompanhar melhor os sistemas de transportes e, ao identificar melhor os custos, é possível agir de maneira mais acertada para deixar os sistemas mais eficientes. É possível saber onde cortar, como eliminar as sobreposições e aumentar a velocidade operacional dos ônibus. Quanto menor a velocidade, maior tende a ser o custo. São mais ônibus para atender às mesmas pessoas, queimando mais combustível, requerendo mais salários de motoristas e desgastando peças e veículos”- conclui Néspoli.

Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

Comentários

Comentários

  1. Excelente iniciativa da ANTT.
    Ótima reportagem.

  2. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa noite.

    Uma dúvida.

    O buzão verde está incluso nesta planilha ???

    Att,

    Paulo Gil

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