OPINIÃO: O ônibus está perdendo a batalha da comunicação?

Por que o sistema de ônibus é tão mal visto pelo brasileiro?

ALEXANDRE PELEGI

A impressão que se tem é que falar mal de ônibus tornou-se parte integrante do discurso diário do cidadão nas grandes cidades. Tudo colabora para isso, a começar pelos congestionamentos que tornam impossível prever quanto tempo irá durar uma viagem, nem quanto tempo o cidadão, à espera no ponto, terá de aguardar por sua condução.

Mas sabe o cidadão de quem é a real culpa dos congestionamentos?

Enquanto a culpa do estrago causado pelo excesso de carros particulares vai para o ônibus, o passageiro, vítima principal, torna-se parte de uma trama maior, em que a outra vítima “aparente” é o sujeito que usa seu carro particular para se locomover na cidade. Carros que em média transportam 1,4 passageiros entopem as ruas, impedem que os ônibus circulem em velocidades compatíveis e, de quebra, tais motoristas sentem-se vitimados por um problema para o qual eles próprios contribuem diária e religiosamente.

Uma pesquisa realizada pela agência Nova S/B em todo o país, chamada ComunicaQueMuda – CQM, monitorou, entre os dias 5 de agosto e 5 de outubro de 2016, perto de 400 mil menções sobre vários temas relacionados á locomoção urbana, como ciclovias, ciclofaixas, corredores de ônibus, VLT, trânsito, velocidade máxima, multas, Uber e taxistas. É interessante que no universo de citações monitorado pela pesquisa salta aos olhos a percepção negativa que a população tem em relação aos serviços prestados pelos ônibus urbanos. Acesse:

Brasileiro se irrita com lotação nos ônibus e ainda quer transporte individual

Para se ter uma ideia, mesmo o metrô e o sistema de trens suburbanos apresentando problemas recorrentes, como superlotação e atrasos, o sentimento negativo sobre os ônibus é bem maior (71,8%) que sobre os trens (62,7%) e o metrô (46,4%). Os principais problemas são lotação, atrasos e demora entre os veículos. Se o sistema de trilhos convive hoje com superlotação, os outros dois pontos não o afetam – atrasos e demora entre veículos. O motivo é óbvio, mas não tão óbvio a ponto do usuário entender e ponderar: trens e metrôs andam em via exclusiva, têm sistema de pré-embarque, carregam muito mais passageiros de uma só vez, não param em semáforos, nem têm pontos a cada esquina. Já os ônibus…

O interessante deste levantamento é que ele reforça esta sensação de que o ônibus não sabe “conversar” com seu passageiro: a agência Nova S/B ouviu internautas que expressam sentimentos arraigados ou visões deturpadas sobre os transportes, sem entender o que de fato prejudica a operação dos ônibus nas diversas cidades brasileiras.

Ainda são poucos os exemplos de empresas de ônibus que abrem suas realidades para os passageiros, mostrando as dificuldades de operação, virtudes do modal e todo batalhão de pessoas e investimentos necessários para operação de transporte coletivo.

Um bom exemplo é a empresa Metra, concessionária do Corredor ABD, entre a capital paulista e o ABC.
A companhia criou o “case” Por Dentro da Metra” pelo qual reportagens em vídeo exibidas no Youtube e Facebook oficial da empresa faz o usuário entrar na garagem e ver como funciona cada departamento – Acesse e veja:

 

Metra inova e usa Facebook e YouTube para mostrar à população como funciona uma empresa de ônibus

O congestionamento, além de ser o principal empecilho para que o sistema de ônibus possa ter indicadores mínimos de qualidade e conforto, como o tempo de espera no ponto e a duração da viagem, colabora para outras questões tão graves quanto estas: o aumento no custo da operação do sistema, que hoje chega próximo a 25% do valor da tarifa, algo como R$ 1 a mais que o usuário da capital paulista paga para poder circular a baixas velocidades nas vias da cidade. Esse percentual é uma atualização de um alentado trabalho realizado em 1999 pela ANTP e o Ipea, chamado “Redução das deseconomias urbanas com a melhoria do transporte público”. O estudo provou que os congestionamentos geram um maior consumo de combustível, um aumento significativo na emissão de poluentes, gerando um forte impacto no sistema de ônibus pela imprevisibilidade que se torna a operação quando o fator temporal é avaliado: a frota de ônibus atua na cidade com baixos índices de produtividade, tendo os excessos no tempo das viagens como um dos fatores mais severos.

O estudo ANTP/Ipea afirmava na época que um dos principais objetivos do trabalho realizado pelas duas instituições era “chamar a atenção das autoridades e da sociedade para o alto custo social advindo da falta de prioridade para o transporte público”. Pelo visto, as autoridades fizeram ouvidos moucos, e a sociedade continuou distante dos motivos reais dos problemas.

O trabalho concluiu que as condições desfavoráveis de trânsito levam a quatro deseconomias principais: primeiro, os tempos de percurso dos usuários de automóvel nas vias principais e suas transversais são aumentados. Segundo, os congestionamentos severos levam ao consumo excessivo de gasolina (nos carros) e de diesel (nos ônibus). Terceiro, os congestionamentos severos implicam na emissão excessiva de toneladas de CO. E quarto, e o mais importante: os congestionamentos severos implicam em um aumento na frota de ônibus que correspondia à época a 16% do total de veículos em operação nas dez cidades que o estudo analisou (grandes cidades brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro).

Resumo da ópera: o aumento da frota devido ao congestionamento severo e o consumo excessivo de combustíveis elevava o custo operacional em proporções que atingiam 10% no Rio de Janeiro e 16% em São Paulo. E aí vem a conclusão que poucos enxergam, e muitas autoridades fingem não ver: este aumento do custo é repassado para a tarifa – onerando o usuário – ou é coberto por subsídios do governo, onerando toda a população indistintamente. Esta socialização do prejuízo causado pelo uso indiscriminado do carro como transporte individual é uma espécie de pedágio às avessas, onde quem paga é a vítima (o usuário do ônibus), e não o culpado (o motorista do automóvel particular).

Se de 1999 até hoje a frota de carros particulares triplicou, numa proporção muito maior que a expansão do viário, a conclusão é óbvia: os congestionamentos impactam agora muito mais fortemente o sistema de ônibus. Se naquela época o percentual era de 16% no impacto sobre o custo operacional do sistema em São Paulo, hoje beira a casa dos 25%, segundo estima um dos autores do trabalho, Eduardo Vasconcellos, consultor da ANTP.

Se as autoridades pouco fizeram para aumentar a prioridade aos ônibus, quase nada foi feito para mostrar ao usuário dos transportes públicos que muito do que ele cobra do serviço não tem razão de ser. Ou melhor, tem toda a razão do mundo, ele apenas está direcionando suas críticas para o destinatário errado.

Tornou-se rotina ouvir palpites os mais inusitados para mitigar o baixo desempenho dos ônibus em São Paulo. A maioria deles sequer resvala na principal causa da maioria dos males do sistema: o excesso de veículos particulares, fato que foi nos últimos anos estimulado pelas autoridades do país sob o argumento econômico de aumento do PIB. Em busca de resultados macro-econômicos, reduziu-se na outra ponta a eficiência do trabalho nas metrópoles, ao mesmo tempo em que aumentou para pior a má percepção dos que se utilizam (e dependem) dos ônibus.

Como garantir produtividade do trabalho se grande parte da mão de obra está presa nos congestionamentos, exigindo gordas fatias do orçamento público para bancar subsídios?

Esta é uma pergunta incômoda, que poucos se atrevem a responder. Enquanto isso, o sistema de ônibus nas grandes cidades vem perdendo feio a batalha da comunicação. E como ensinava o velho guerreiro Chacrinha, quem não comunica, se estrumbica…

Alexandre Pelegi, jornalista especializado em  transportes

 

Comentários

Comentários

  1. Daniel Duarte disse:

    Tudo isso mostra que investir em corredores de ônibus, é uma necessidade cada vez mais urgente para dar uma resposta rápida aos congestionamentos, pois esperar anos por trilhos não da mais ( embora não menos importante ).

  2. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa noite.

    Esta pergunta eu respondo.

    Simples, porque o buzao nao funciona.

    Vamos aos motivos:

    1) Sistema operacional inerte e antiquado, nao ha gestao, so fiscalizacao engessada.

    2) Linhas longas, zigzagueadas, caranguejadas , sobre postas e em cima de linha de metro (407-P, 809-H, 748-J, Belem Bonfiglioli e outras que nao conheco)

    3) Um ponto a cada 600 metros, aproximadamente.

    4) Nao se faz nenhuma otimizacao sem a maldita licitacao hibrida ser realizada.

    5) Nao ha uma rede que liga aos trilhos, entre pontos movimentados e os trilhos.

    6) A fiscalizadora e surda.

    7) Um TCC, provou a fragilidade do BU.

    8) O servico 156, nao funciona

    9) Mesmo com GPS, o “carro bota” esta ai nas vistas de todos.

    10) Um buzao de 21 x 21.

    11) Ponto inicial em plena faixa exclusiva do buzao, ou seja, o buzao atrapalhando o proprio buzao, se nao me engano a 8023.

    12) Sujeira interna no buzao, nos Terminais e nas paradas dos corredores.

    13) Catracas internamente.

    14) Carrocerias sem ergonometria, apoio de cabeca duro, degrau ALTO INTERNAMENTE e bancos la no alto tambem com enormes caixas de roda.

    15) Nao ha ligacao com linhas entre Terminais e Trilhos.

    Bom, vou parar por aqui, afinal tem muito mais itens, mas todos ja sabem.

    Se eu lembrar de mais alguma importante eu complemento.

    Querem fazer o buzao de Sampa funcionar, eliminem a interferencia da fiscalizadora e deixe m quem sabe trabalhar com buzao teaballhar so isso.

    Acabem com as pinturas partidarias.

    Esquecam a licitacao, devolvam as garagens aos seus donos.

    Devolval o meu saldo do meu BU que foi roubado.

    Reconhecam os erros, afinal reconhecer o s erros e sinal de inteligencia.

    Parem de culpar o carro e esquecam BRT no nivel da rua, nao ha espaco fisico e nem dinheiro para pagar desapropriacoes.

    Lembrando que se o Aerotrem tivesse funcionando, muitos carros nao estariam nas ruas.

    Agora pra fechar com chave de ouro, aos sabados e domingos o buzao fica pior ainda, poque ai nao tem mesmo.

    Alguem discorda desta resposta ????

    Att,

    Paulo Gil

    1. Paulo Gil disse:

      Amigos, boa noite.

      Complementando, o porque o buzão de Sampa “NÃO” funciona.

      Faixa do buzão na Av. Vital Brasil (sentido bairro-centro) 3 quarteirões antes da Estação Butantã da Linha 4 Amarela do Metro, em 20.04.17 as 8:35 hs. aproximadamente.

      1) Linhas 8012 e 8022 ficam “presas” nesse congestionamento de buzão SEM NECESSIDADE, essas linhas não precisam ter parada dentro do Terminal Butantã; assim, elas são duplamente ineficientes. A) Com elas mesmas. B) Atrapalham as demais linhas que passam pela Av, Vital Brasil no sentido bairro centro, aumentando o congestionamento de buzão.

      2) Na frente da Estação Butantã, os carros particulares param para dar embarque e desembarque de passageiros, isto porque a placa que se encontra na frente da estação é só de proibido estacionar e NÃO de proibido estacionar e parar (grave falha técnica).

      O ponto do buzão tem de ser na frente da estação, impedindo automaticamente os carros particulares de parar para dar embarque e desembarque.

      3) O Terminal Butantã tem suas entradas a 90 graus, principalmente a entrada da Av. Vital Brasil.

      4) A 8019 para sentido Pinheiros, mas como vai sentido Vila Yara, tem de dar a volta completa no Terminal para sair para a Vila Yara. Rssssssssssssss (essa é engraçada, para não dizer ridículo)

      5) Na 8012, tinha um buzão parado fora do ponto e no ponto uma fila enorme de passageiros.

      Parafrazeando o ex Prefeito Paulo Maluf:

      “BUZÃO BOM, É BUZÃO RODANDO”

      No buzão que eu embarquei ouvi uma coisa que eu não ouvia há muiiiiiiiiiiiiiiiitos anos, a cobradora pedindo aos passageiros: “Um passinho à frente por favor“

      Afinal pra tras já não dava por os buzões de hoje não tem corredor, portanto lota fácil.

      No meu tempo era: “Um passinho a frente por favor”

      Rssssssssssssssssssssssssssssss

      Eu dou as dicas mas a fiscalizadora é inerte e mumificada.

      6) E para fechar com chave de ouro o carro que estava parado no ponto segui VAZIO atrás do buzão que eu tomei, o qual ultrapassou o que eu estava no ponto que eu desci.

      Muuuuuiiiiiiiiiiiiiiiiiiito triste, para não falar o português claro em respeito ao Diário e seus leitores.

      OBS.: As fotos que comprovam os itens 1 e 4 já foram enviadas ao Diário.

      Att,

      Paulo Gil

  3. andersamt disse:

    Aguardando o tal do Rapidão do Doria. É uma esperança.

    Se ele melhorar um pouco o sistema, com a expertise dele em comunicação ele pode reverter esse fato apresentado pelo artigo. Ele parece querer focar nos ônibus, visto que viajou para Seoul só para isso.

  4. Luiz Vilela disse:

    Sim, concordo com Paulo Gil.
    Acrescento:
    – Planejamento de modelos/tamanhos de ônibus em função das vias que trafegam é falho
    – Forçam uso de ônibus para média e alta capacidade. Resultado: ganham as cias de ônibus com mais bihetes (linhas “filè”) e perdem a cidade, o usuário e as gestões públicas.
    – Eternizam rotas de ônibus por décadas, “matando” uma das maiores virtudes deles: a versatilidade para rotas. “Via permanente” deveria ser conceito exclusivo para trilhos, mas não é o que ocorre na RMSP.
    – Primeiro mundo usa CHECK OUT = controle de saída.
    Permite uma série de pesquisas rápidas e precisas e controle superior para aperfeiçoar o sistema. Só que por aqui nem nos trens – onde é bem mais fácil – se usa, quanto mais nos ônibus.

    1. Paulo Gil disse:

      Luiz Vilela, boa noite.

      Bom ler você por aqui.

      Muito obrigado e também concordo com o que você acrescentou.

      Hoje utilizei o buzão 8 1034, um Vialle já meio rodado e com cambio automático totalmente desregulado ou quebrado, e fazendo a ex extinta linha “Vila Gomes”.

      O buzão não deslanchava ele reduziu, o piloto tava num sufoco para fazer que trambolho andar, quando eu desci falei pra ele:

      “Meu, esse câmbio já era” e ele concordou.

      Ai tive uma ideia.

      Em corredores somente tem de operar ELETRA, BYD, ou TRÓLEBUS, Diesel em corredor já era.

      E tem mais, eu utilizei a plataforma paulista e o embarque no buzão é muito lento.

      Nos corredores movimentados já passou a hora de ter pré pagamento, já realocando os cobradores e a catraca interna semi liberada agilizando o embarque.

      E o GPS contabiliza quais buzão passaram para receber.

      Ainda querem saber porque a população não usa o buzão.

      E tem mais uma fotos sensacionais que tirei hoje, cada aberração…

      Forte abraço.

      Paulo Gil

  5. Luiz Vilela disse:

    Olá Paulo Gil!
    Sim, diferenciados nos corredores é boa ideia, até porque dificulta que saiam do corredor – o que não deveriam fazer.

    Vários amigos falam que catraca é “3o. mundo”.
    Infelizmente falta um bocado de consciência cidadã aos usuários, mas convenhamos: a tecnologia fartamente disponível de sensores, RFID, códigos de barras, etc, dispensa catracas. Como os cobradores vão sumir, o segundo funcionário embarcado – entre outras funções, claro – poderia disciplinar os “espertos” que não fizessem check in. O centro do Rio com seu VLT nos dá o exemplo.

    Olha só um exemplo: usuário faz check in num ponto/parada; chega o ônibus, faz outro após subir nele; finalmente faz check out na saída.
    Tudo sem catraca! Se ele fizer os 3, o sistema saberá não só quanto tempo e distância ele ocupou o ônibus, mas quanto tempo esperou por ele.
    Uma Autoridade Metropolitana de Transportes teria ferramenta incrível para gestão da rede.

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