OPINIÃO: A leniência com a segurança viária e o mar de radares em São Paulo – dois pesos e duas medidas

frota cabrita

“Frota Cabrita”, de veículos velhos, coloca em risco a segurança viária, mas não é levada em consideração pelas autoridades. Foto:Moacyr Lopes Junior/Folhapress

Usar dinheiro de multas para pagar pessoal, funcionários públicos e pagar aparelhos de transporte público, não seria nenhum pecado e em si, mas, para isso, tinha antes que mudar a lei federal sobre multas de trânsito.

OLÍMPIO ALVARES

Os problemas do questionamento pelo Ministério Público do excesso de radares em São Paulo são dois: (1) o exagero, em si, que transformou a cidade numa árvore de Natal, onerando sem dó nem perdão bons condutores, em caso de pequenas distrações momentâneas ao passarem em baixíssima velocidade à frente de radares; (2) ao invés de usar o dinheiro do tesouro, aprovisionado no orçamento do ano anterior para custear as despesas previstas com salários e custeio da CET e para melhoria dos transportes públicos – despesas que precisam ser cobertas, haja dinheiro de multas de trânsito ou não – a Prefeitura usa a receita das multas para honrar essas despesas previstas no orçamento. Assim, o dinheiro do tesouro aprovisionado para isso, que sobra no caixa da Prefeitura, é desviado para cobrir outras despesas. Mas, o dinheiro das multas é carimbado por lei para investimentos na melhoria dos equipamentos de trânsito, educação de trânsito etc, que ficaram descobertos e não foram realizados, conforme previsto em lei. Usar dinheiro de multas para pagar pessoal, funcionários públicos e pagar aparelhos de transporte público, não seria nenhum pecado e em si, mas, para isso, tinha antes que mudar a lei federal sobre multas de trânsito. Mas, lembre-se, que isso não é uma prática compatível com os melhores padrões da administração. Na hora do aperto, há mesmo pressões sobre fiscais, inclusive com o estabelecimento de metas de produtividade, algo impensável em ambientes civilizados.

São assim, dois pesos e duas medidas na gestão da segurança viária: por um lado, o exagero exacerbado dos radares sobre os que normalmente são cumpridores das regras de trânsito, como eu e você, por exemplo. Do outro lado, o mesmo gestor municipal, aparentemente zeloso, implacável, mão de ferro, “revolucionário”, quebrador de paradigmas – supostamente visando somente o bem e a segurança dos cidadãos (nunca um aumento da arrecadação) – mostra-se leniente ao fechar os olhos para o maior de todos os problemas que ameaçam a vida e a saúde de todos, especialmente dos pedestres: a frota Cabrita, que não realiza mais o licenciamento – frota ilegal, que não paga mais as multas, velha, poluente, insegura, mas que circula livremente e que pode, eventualmente, fazer a alegria e o caixa dois dos fiscais do transito: 30% da frota de veículos de 4 rodas e 50% das motos em São Paulo são Cabritas –  cerca de dois milhões de carroças ambulantes que ameaçam a vida de todos na Região Metropolitana – RMSP.

Lembre-se, que a Prefeitura de São Paulo, que se gaba de privilegiar o transporte coletivo e o não motorizado, acabou com a inspeção veicular para agradar quem anda de automóvel particular, incentivando ainda mais seu uso descontrolado. O Governo do Estado, esse parece ainda não ter sido informado que existe uma obrigação legal de executar a inspeção veicular anual de emissões e segurança desde 1993 – Resolução Conama 07/1993 e Lei Federal 9.503/1997, art 104.

Há que ser feita uma forte campanha para por um fim na frota Cabrita; esses sim, oferecem o grande risco para você que transita nas ruas e estradas brasileiras. Sem isso, diga-se adeus a qualquer politica de seguranca viária e controle de emissões veiculares.

Olimpio Alvares é Diretor da L’Avis Eco-Service, especialista em transporte sustentável, inspeção técnica e emissões veiculares; é membro fundador da Comissão de Meio Ambiente da Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP, Diretor de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Associação Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades – SOBRATT e ex-gerente da área de controle de emissões de veículos em uso da Cetesb

Comentários

Comentários

  1. Bruno Quintiliano disse:

    Radar e marronzinho multando coitadinho? Piada né? Basta andar por São Paulo pra ver que o número de multas é muito pequeno, frente ao desrespeito, a faixa de pedestre,velocidade, faixa de ônibus, proibição de estacionamento e por aí vai. Tem que ter radar e tem que ter marronzinho escondido sim, pra multar quem corre e invade faixa de ônibus e só anda dentro das regras onde sabe que tem fiscalização.

  2. Júlio disse:

    Blá, blá, blá… Esse papo furado de “indústria da multa”… Em 15 anos NUNCA fui multado. Isso é coisa de gente que não respeita o trânsito e não tem respeito pela vida (sua e dos outros). Se eu fosse prefeito colocaria um radar em cara esquina e destinaria o dinheiro todo para o transporte público.

  3. Não adianta fiscalização plena se a própria população não respeita as regras. Ou não são educadas para tal. Falta muita educação de todas as partes.

    Frota cabrita existe por motivos sociais e políticos. Se “vendeu” a ideia que um carro é um jeito de fazer a vida, é a liberdade, é a praticidade. Não vamos ser hipócritas – sim, ter um carro facilita e muito. Mas tem seus custos básicos (manutenção e combustível) e custos legislativos (impostos, taxas e multas quando aplicável). Para uma pessoa pobre, um caminhão de 10 mil reais (como o da foto), com mais de 40 anos, é o ganha pão. Só que ele não é visto pelo poder público também como um problema a ser corrigido.

    Ele só é mais um número para se aplicar multas. Não que o dono do caminhão não esteja errado – ele está. Mas na cabeça dele, oriunda de culturas de anos atrás, onde não havia fiscalização plena, e quando existia a mesma era muito mais corrupta, as leis só o atrapalham. E é este tipo de cultura que tem que ser trocada, reeducada.

    Até porque a juventude está também assumindo esta ideia de que as leis só os atrapalham. O que vejo de jovens abusando com seus veículos daria para encher os caixas da prefeitura por anos.

    Temos que parar com o papo de “indústria das multas”, mas ao mesmo tempo educar a população para que justamente entenda que multa é uma PUNIÇÃO, não um IMPOSTO ou TAXA para ele andar. Senão é enxugar gelo. O governo vai usar os recursos das multas para outras coisas, e a população só vai viver reclamando que é roubado com as multas.

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