Jardim Zaíra: Exemplo da importância social do ônibus ao longo da história

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Nos anos de 1970, o Zaíra começou a se expandir para os morros. O crescimento populacional foi desordenado. Mesmo assim, os ônibus foram onde a população estava e ligavam os moradores às regiões que ofereciam direitos básicos, como saúde, educação e trabalho FOTOS VISITE: http://www.mauamemoria.com.br

Jardim Zaíra: Uma história que é o exemplo vivo do papel social dos ônibus
Bairro corresponde a um quarto da população de Mauá. Carente de serviços ao longo da história, moradores tinham acesso aos direitos básicos por causa dos serviços de ônibus
ADAMO BAZANI – CBN
Quando se fala que o ônibus é um agregador social e que não é apenas um veículo automotor, mas um veículo que conduz à cidadania, muitas pessoas que moram em locais bem atendidos por serviços básicos ou mesmo os mais jovens que, apesar das dificuldades, conhecem as cidades já crescidas, podem não ter a noção da importância do ônibus para que os cidadãos tenham acesso a direitos sociais, como saúde, educação, emprego e renda.
A história e o presente mostram esse papel fundamental dos transportes.
E um dos exemplos da importância dos ônibus para que a cidadania seja uma realidade na vida das pessoas, mesmo ainda boa parte dos brasileiros estando muito longe do ideal, é o Jardim Zaíra, bairro de Mauá, na Grande São Paulo.
Os moradores da região do ABC Paulista costumam dizer, e é verdade, que o Zaíra é uma cidade dentro de outra cidade.
A região, formada por Zaíra I, Zaíra II, Zaíra III, Zaíra IV, Zaíra V, Zaíra VI e o Morro do Macuco, tem mais de 110 mil moradores, o que corresponde a ¼ da população de Mauá.
Pode-se dizer que o bairro tem uma região central, localizada ao longo da Avenida Presidente Castelo Branco, que é margeada pelo córrego Corumbé. Há vários estabelecimentos comerciais, unidade de saúde, um terminal de ônibus tronco-alimentador, mercados, agências bancárias, escolas, mas a população ainda não tem todas suas necessidades atendidas.
Tanto é que para fazer atividades corriqueiras, ainda boa parte dos moradores da região do Zaíra precisa se deslocar para o centro da cidade. Quanto ao trabalho, a situação ainda mostra que não só bairro, mas Mauá, precisa ainda mais de desenvolvimento. Grande parte dos trabalhadores tem empregos em outras cidades, como Santo André, São Caetano do Sul e São Paulo.
Neste aspecto, o transporte ainda se torna mais importante. Já que as pessoas do Zaíra se deslocam de ônibus municipais até a estação de trens da CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, de onde partem para seus locais de trabalho.
Há também linhas de ônibus intermunicipais.
O principal acesso para a região do Zaíra, a Avenida Presidente Castelo Branco, não é o dos melhores. O trânsito é complicado, as condições da via são ruins e quando chove, há vários pontos de enchente. Sem prioridade, o transporte público fica preso nos congestionamentos prejudicando os passageiros. A prefeitura de Mauá diz que aguarda recursos federais para fazer uma marginal e implantar faixas de ônibus.
O “centro” do Zaíra é rodeado por morros, que ao longo do tempo, com o crescimento populacional desordenado em Mauá foram tomados por construções simples e nem sempre seguras, com riscos de desmoronamentos. O Zaíra V, por exemplo, é uma odisséia para o transporte público. Micro-ônibus cortam os morros. Das janelas, é possível ver boa parte da cidade que mescla beleza natural com imagens do abandono e da pobreza dos barracos e casas bem simples. No meio do caminho, é possível se deparar com bois de pastagens presentes no bairro.
A história oficial do Jardim Zaíra tem início em 23 de julho de 1956, quando o prefeito da recém emancipada Mauá, Ennio Brancalion, assina o decreto de número 23 autorizando Chafik Mansur Sadeck a vender lotes na região. O nome Zaíra é uma homenagem à mãe de Chafik, Zaira, que pronuncia-se sem o acento no “i” . Mas a população pronunciava com acento, oficializando o nome do bairro.
O loteamento começou em 1952. As terras eram do industrial João Jorge Figueiredo, dono se fábrica de produtos de cerâmica. Aliás, a cerâmica foi uma das principais atividades de Mauá até os anos de 1980. João tinha uma das fábricas na estrada do Corumbé, hoje Avenida Presidente Castelo Branco
A região do ABC com a implantação da indústria automotiva se tornava cada vez mais interessante para brasileiros de diversas regiões. As áreas mais próximas às indústrias e estações de trem e terminais de ônibus tinham imóveis caros.
Sobrou à população mais pobre e com menos qualificação profissional, a opção de morar nas áreas mais afastadas.
Para atrair moradores, a exemplo de outros bairros, os lotes no Zaíra eram vendidos a prazo e ainda o comprador ganhava 5 mil tijolos, 300 telhas, vitrô para banheiro, uma janela e uma porta, o que já dava para fazer uma moradia bem simples.
O crescimento para os morros se intensificou nos anos de 1970, quando, além das montadoras de veículos, o ABC se fortaleceu nos setores de construção civil e autopeças.
E desde as primeiras glebas do Zaíra até os atuais morros, aparentemente inacessíveis, os ônibus acompanharam o crescimento da população e ainda vão onde não há outros serviços.
Um dos pioneiros dos transportes de Mauá foi o italiano Guido Bozzato, que nasceu em 1910, em Casier, norte da Itália.
Guido chegou ao Brasil em 1937, onde em jardineiras, ônibus simples feitos de madeira, transportava passageiros de Marília a Paraguaçu Paulista.
Em 1939, Guido e a família se mudaram para a região correspondente ao ABC (na época toda a área era São Bernardo da Borda do Campo). Após atuar em olarias, plantações de eucaliptos e transportar cargas para empresas como Pirellli, Firestone e Antarctica, além de levar romeiros para Aparecida no caminhão, bem ao estilo pau-de-arara, vende seus cinco caminhões e em 1957 compra uma pequena empresa de ônibus que atendia Mauá, a Auto Viação Barão de Mauá.
Em 1968, aproveitando o crescimento da indústria automobilística do ABC, a família funda uma empresa de fretamento, a Turismo Bozzato.
A Auto Viação Barão de Mauá acompanhava o crescimento da cidade.
Nos anos de 1980, com o enfraquecimento financeiro dos empresários de ônibus do ABC, após os surtos ocasionados pela inflação, entra na região do ABC o chamado Grupo dos Mineiros, liderado por Constantino de Oliveira e que tinha outros empresários como Baltazar José de Souza, Ronan Maria Pinto, Mário Elísio Jacinto.
Baltazar assume a Viação Barão de Mauá.
Em 1986, era constituída outra empresa na cidade, a Viação Januária, com sócios como Ronan Maria Pinto e Mário Elísio Jacinto.
Em 1992, Ronan e Mário Elísio deixavam a empresa, que era assumida integralmente por Baltazar, parceiro de negócios dos dois empresários.
Nesta época, a Januária servia a região do Zaíra.
Motoristas mais antigos dizem que se hoje a região dos morros do Zaíra não é fácil de transpor até os anos de 1980 era um verdadeiro desafio controlar um ônibus em ruas em situação pior e com veículos dotados de menos tecnologia.
No entanto, as operações da Viação Barão de Mauá e Viação Januária se tornaram inconstitucionais a partir de 1988, já que a Constituição desta época determinava que todo serviço público prestado por empresa particular tinha de ser concedido por licitação.

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Dos anos de 1990 até 2010, a região do Zaíra era atendida pela viação Januária, de Baltazar José Sousa.

Mas para as diversas gestões da prefeitura de Mauá, a lei pouco importava. Em 2006, o Ministério Público determina a realização de uma licitação, que só foi feita em 2008 e finalizada em 2010. Como as empresas Barão de Mauá e Januária apresentavam problemas legais que as impediriam de participar de licitações, de acordo com a Junta Comercial de São Paulo, em 19 de abril de 2006, Baltazar cria três empresas para participar da licitação: Viação Cidade de Mauá, Viação Estrela de Mauá, Trans-Mauá.
A licitação dividiu Mauá em dois lotes operacionais. Baltazar permaneceu no lote 01 com a Viação Cidade de Mauá, mas em 2010, a Justiça Federal e a Prefeitura reconhecem a vitória de uma empresa paranaense para operação do lote 02, que inclui o Zaíra: a Leblon Transporte de Passageiros.

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A partir de 2010, o monopólio dos transportes em Mauá foi quebrado com a entrada da empresa Leblon Transporte. Apesar de necessitar de melhorias, o início das operações de uma nova companhia trouxe avanços, como frota 100% zero quilômetro e acessível, além de mais ônibus.

Apesar de ainda necessitar de melhorias, a população diz que os serviços da nova empresa trouxeram avanços, como a implantação de toda frota acessível e zero quilômetro, além do aumento do número de ônibus e viagens. A Januária em 2010 contava com 64 ônibus. Naquele ano, a Leblon colocou 88 veículos novos. Hoje são 92 ônibus.
O fato inegável é que, seja com a Barão de Guido Bozzato, depois de Baltazar, com a Januária de Ronan e depois de Baltazar e hoje com a Leblon, da família Isaak, o ônibus sempre esteve presente na história do Zaíra e também oferecendo acesso a população aos direitos básicos.
Os ônibus vão onde o povo está. E os morros do Zaíra são provas de que por mais modernos que possam ser alguns sistemas, como monotrilho, VLT e metrô, há locais neste país, e nem sempre tão longe dos grandes centros de prosperidade, que só os ônibus poderão alcançar
Adamo Bazani, jornalista da Rádio CBN, especializado em transportes.

Comentários

Comentários

  1. Marcos disse:

    Bonita a história , mas não devemos esquecer que como foi dito tem mais de cem mil moradores , só não entendi que quando os carnês do IPTU chegam os números apontavam que só 64 mil são contribuintes , aqui no Miranda o bairro todo paga ,e não temos nenhum farol descente para atravessarmos a principal AV. de Mauá , Barão , os comerciantes lutam para ter melhorias no Jd. Maringá , Miranda e Av. Benedita Franco da Veiga e não somos escutados , será que é só o Zaira que contribui para o crescimento de Mauá ? – A Leblon colocou uma linha de ônibus , o circular chacáras , mas parece que a prefeitura mandou tirar , será que aquele povo não merece também mais respeito , o Jd. Canadá , Luzitano, Olinda ,etc. E digo mais , estão construindo clandestinamente aqui numa área protegida (Miranda ) e até agora a prefeitura não deu um basta , daqui a pouco vão dizer que é Zaira e fica tudo certo.

  2. Clovis Alberto disse:

    Belissima matéria.. eu vivi tudo isso… Esse Caio Jaragua andei muito nele.. morrom e aluminio…. Velhos tempos.. belos dias…

  3. João Luiz disse:

    Parabéns pela materia eu que já vivi boa parte desta história ao longo dos meus quarenta e oito anos, me sinto bastante emocionado ao relembrar todo o nosso sofrimento e que até hoje ainda é para se pegar um onibus.

  4. Linda matéria, Adamo Bazani. Pena que o CÂNCER do Baltazar ainda atrapalha.

  5. Anderson disse:

    Parabéns Adamo. Brilhante matéria. Bom saber da importância de nossas ações aí em Mauá, dentro de uma história como esta. Abraço.

  6. Jose Carlos Leite disse:

    O Jd.Zaira cesceu muito, precisa ser visto com mais responsabilidade dos politicos de Maua, pois, um Bairro tão grande, é uma vergonha o trabalhador pobre que tem poucos recursos financeiros precise sair do bairro para ser atendido na UPA de outro Bairro, como tem acontecido muito. Também tem o caso dos Postos de Saúde que não atende como deveria, faltam remédios que é um direito da população. Já a Zona Azul, que cobra para estacionar o carro na rua souberam fazer bem feitos né ??? até em rua sem movimento tem essa porcaria. Cadê os vereadores do bairro?? tem varios, tem uns que só vai sair da camara quando for para o cemitério, pois, têm votos certos até o final da vida. Enquanto esses eleitores acreditarem nas historinhas que eles contam nas vesperas das eleições, vão ficar aí. Pena que só o Bairro cresce, más as pessoas continuam como no passado, votando em batores, tiriricas e outros bichos……

  7. Jose Carlos Leite disse:

    Referente a resposta do munícipe acima, realmente são aproximadamente 64 mil carnês de IPTU, isso quer dizer que são aprox. 64 mil residencias. Logo, cada residencia tem em média 3 pessoas, sendo assim, cada residencia só recebe um carnê do IPTU, não um Carnê para cada morador. Por isso a diferença.

  8. elias carneiro da silva de Curitiba paraná disse:

    Quando Era Barro Todas As Ruas Ninguém Queria Colocar Empresa de Ônibus Aqui Somente A Nossa Humildade de Pessoa Que é BALTAZAR NÓS DERVEMOS FAVOR PARA ESSA SENPATIA DE PESSOA

  9. Paulo Gil disse:

    Amigos, boa noite.

    Lindas as fotos, e, especial a do Caio 42.

    Att,

    Paulo Gil
    “Buzão e Emoção essa é a nossa Paixão”

  10. Evandro disse:

    Adamo, muito honrado de ver o nome do meu Nonno entre as histórias. Guido foi mais que um grande homem e tenho ele como grande exemplo. Não conhecia este blog, vi pelo Mauá memória! Muito bacana!

  11. Beto Silva disse:

    Eu morei de 1972 a 1983, na Avenida Presidente Castelo Branco, no Jardim Zaira. Eu passava várias horas debruçado no muro de casa vendo a movimentação da via. Me lembro das mudanças no fluxo de veículos, sempre aumentando, me lembro da lotação dos ônibus. Era muita gente e mais e mais bairros surgiam a partir do “Fundão do Zaira”. A matéria retrata bem essa mudança. Parabéns!

  12. Isidoro Vieira de Castro disse:

    Parabéns pela matéria.
    Ainda que com atraso, mas ainda em tempo, cabe salientar ainda mais os efeitos do transporte coletivo por ônibus, já que nunca existiu mais que um Zaira.
    Essas denominações foram sendo criadas a partir da implantação de novas linhas que recebiam o “I, II, III, IV, V e VI” para diferenciar os trajetos de cada uma.
    Para a prefeitura é um Zaira só.

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