História

AS INOVAÇÕES DA INDÚSTRIA DE ÔNIBUS QUANDO A GIGANTE ABRAÇOU A GRANDE

Quando a Grande se cruzou com a Gigante
Compra da Eliziário pela Marcopolo foi um dos maiores negócios da história da indústria de ônibus no Brasil

ADAMO BAZANI – CBN

Integração, momento de crescimento para a indústria de ônibus e concentração do setor e olho no mercado externo são algumas das mensagens na bem elaborada peça publicitária que registra uma das primeiras grandes negociações na história do setor de transportes, quando a Marcopolo comprou a Eliziário

Os anos de 1970 refletiram duas realidades no setor industrial brasileira: ao mesmo tempo que a inflação corroia os ganhos de algumas indústrias, fazendo com que muitas fechassem as portas ou tivesse de adequar novos processos, outras investiam de maneira pesada, aproveitavam justamente este momento de concentração de mercado e cresciam
A industrialização ainda sentia os reflexos da política desenvolvimentista adotada a partir do Governo de Juscelino Kubitscheck nos anos. Principalmente o setor de automóveis e a cadeia produtiva se desenvolviam e as cidades também.
Era uma bola de neve positiva para o setor. Enquanto a indústria de automóveis crescia, mais gente vinha para os centros urbanos onde ela estava instalada, em especial no ABC Paulista e Capital, em busca de empregos e melhores condições de vida, o que nem sempre era encontrado. O número maior de pessoas nas cidades, expandia as áreas habitadas, aumentava as áreas de periferia e criava uma demanda maior para os transportes, principalmente públicos, o que representava uma boa oportunidade para as indústrias de ônibus.
Foi nos anos de 1970 que as grandes encarroçadoras começaram a se tornar gigantes.
A CAIO, por exemplo, compraria a Metropolitana, uma empresa de destaque no Rio de Janeiro.
A Marcopolo, anteriormente chamada Nicola, por conta do nome de uma das famílias fundadoras, foi às compras. No anos de 1970, fazia parte do grupo o conglomerado de empresas como Marcopolo Minas S.A., Nimbus, Invel e a Eliziário.
A compra da Eliziário pela Marcopolo na época marcou o mercado. Pode se dizer que foi um dos primeiros grandes negócios do setor.
A Marcopolo se orgulhou da fusão. Afinal, Eliziário era uma marca que representava tradição e qualidade desde meados dos anos de 1940, quando ainda os ônibus eram feitos de madeira. Apesar de ser uma empresa forte no Sul do País, a Eliziário era uma marca nacionalmente conhecida a partir dos anos de 1960, quando também aproveitou o bom momento da indústria voltada para a política rodoviarista.
A empresa teve diversos modelos que figuraram nas paisagens urbanas e das estradas das mais diferentes regiões do País.
Exemplos são:
ANOS 40:
Eliziário Micro
Eliziário Rodoviário
Eliziário Coach Urbano

ANOS 50:
Eliziário Micro (urbano e rodoviário)
Eliziário para Aplicações Rodoviárias
Eliziário Urbano

ANOS 60:
Eliziário Bi-Campeão (aproveitando o momento de o Brasil estar animado com o segundo título mundial de futebol)
Eliziário Bi-Campeão Super Luxo, uma versão mais sofisticada do Eliziário Bi Campeão, com poltronas mais largas, anatômicas e mais espaço entre elas, oferecendo maior conforto.

ANOS 70:
Eliziário Astro Rodoviário
Eliziário E 3000 Rodoviário
Eliziário E 3600 Rodoviário
Veneza II
Alguns Veneza Expresso (já fazendo parte da Marcopolo)
Primeiros Torino

O anúncio da foto é uma peça publicitária rara resgata pelo pesquisador e historiador Salomão Jacob Golandski.
A foto é sensacional, um ônibus com a marca Eliziário se encontra com um Marcopolo, os motoristas se dão a mão. Sinal de quer as histórias se cruzaram e que, apesar de uma empresa, no caso, a Marcopolo, adquirir a outra, a Eliziário, o tratamento seria de igualdade e parceria. A compra não seria uma imposição.
Diz ainda todo o texto do anúncio, publicado na Revista de 1970:

“Cruzamos nossos caminhos!
O negócio foi o seguinte: no 1 de junho último compramos a totalidade das ações de Carrocerias Eliziário S.A. e passamos a operar em sua fábrica em Porto Alegre, Claro, olho no futuro. Os desafios dum País que cresce em ritmo acelerado. Vamos correr juntos. Crescendo para atender um mercado interno, que já dominamos, e outro externo, que já começamos a conquistar. Já imaginou nosso “know how”, moderno e avançado, acrescido da tradição e experiência Eliziário. Os ônibus do amanhã, meu caro. Ou porque você acha que compramos a Eliziário.
Marcopolo
Carrocerias Nicola S.A.
Bairro Planalto – Caxias do Sul
Rio Grande do Sul.”

O texto é formidável e revela vários aspectos importantes. Primeiro, o que já destacamos que apesar da compra, a Marcopolo não quis mostrar-se como a impositora. Tanto é que ela disse que o que ocorreu com a compra foi um cruzamento de caminhos. Mais a frente, ela diz que a partir da negociação concretizada no primeiro dia de junho de 1970, Eliziário, a comprada, e Marcopolo, caminhariam juntas.
Depois, o anúncio mostra outro aspecto importante, a força da marca Elziário. Tanto é que o texto destaca que o moderno e avançado know how da empresa se aliaria à tradição e experiência da Marcopolo. Mais um detalhe era a preocupação com o mercado externo. Se até os anos de 1950, o Brasil não tinha suficiência para fazer ônibus de destaque e qualidade e tinha de importar veículos para oferecer serviços diferenciados, como ocorreu com a Expresso Brasileiro e Cometa a partir desta década na disputadíssima linha Rio – São Paulo, nos anos de 1970, graças a substituição de exportações, pela política de desenvolvimento interno da indústria e a exigência das empresas e passageiros.
Agora, era a vez de exportar os ônibus. E o Brasil começava a ganhar mercado externo.
A compra da Eliziário foi uma estratégia também para se avolumar, ganhar mercado nacional, mas já pensando no internacional.
Por fim, outro detalhe curioso, é a marca da assinatura da Marcopolo. Marcopolo Carrocerias Nicola S.A. Em 1970, a empresa tinha acabado de mudar de nome, estimulada pelo sucesso do modelo Marcopolo e pelo fato e nenhum Nicola mais fazer parte da sociedade da empresa. Em 1960, os primeiros integrantes da família Nicola começaram a sair para fundar a Furcare, depois Nimbus, outra aquisição da Marcopolo.
Mas mudar de marca de forma abruptamente poderia ser um erro de estratégia de imagem. Por isso, o nome Nicola ainda permanecia.
No início dos anos de 1980, a marca Eliziário desaparecia do mercado. Mas em sua planta, um último feito para a indústria nacional. Lá foi feito o primeiro Torino, que foi lançado oficialmente em 1983, e, depois de várias gerações, é um dos modelos mais longevos no mercado de ônibus urbanos ainda hoje.
Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes.

Comentários

Comentários

  1. Gustavo Cunha disse:

    Boa noite Adamo !
    Posto aqui o primeiro comentário sobre a matéria. Antes porém, desejo que estejas bem ! A Marcopolo inspira desde sempre, qualidade, robustez, buscando a vanguarda no setor de carrocerias de ônibus, mas, apresento aqui um senão; não raro em contatos com alguns empresários de ônibus, estes manifestam uma certa decepção com o tratamento que a encarroçadora dispensa a alguns clientes, os de pequeno, médio porte, em crescimento, somente valorizando-os, tempos mais tarde. É a velha história do vendedor de automóveis que olha as vestes do simplório cliente que, adentra pela loja, olha, olha, e, não é atendido e quando finalmente alguém lhe pergunta o que deseja, comprá um tomóvel, seo moço, e que mal lhe pergunte, como o Sr. vai pagar ? À vista, moço; e coloca sobre a mesa um saco de pano e dele, milhares e milhares de cruzeiros saltam aos olhos do “pobre” vendedor.
    É isso aí.
    Abraço.

  2. Legal Gustavo, ta aí um detalhe que eu não sabia e que pode ser apurado. Abraços.

  3. gabriel disse:

    a CAIO, tinha fábricas no rio, no Nordestes, no centro-oeste;
    nos anos 90 foram quase todas fechadas!

    1. gabriel disse:

      RIO, Nordeste(Recife), Cuiabá se não me engano no Centro oeste.
      encarroçava em média 1000 carros por ano

  4. Marcos Galesi disse:

    A qualidade da Marcopolo é incontestável, só vermos a qualidade dos trolebus quando foi feita a reforma deles, a carroceria de forma robusta mostra que pode durar uns 30 anos. E podem notar que desde 1996 a carroceria não apresenta nenhuma trinca ou bateção de lata como alguns ônibus que são até mais novos.
    E não devemos esquecer que quase 60% da Neobus pertence à Marcopolo.

    Adamo, parabéns pela matéria

    Abraços

    Marcos Galesi

    1. gabriel disse:

      é mas os da CAIO são também bem robustos, existe no rio, uma cidade que mantém Gabrielas. os veículos parecem ser da década de 90. o frotista decidade muito o tempo de duração do veículo. se for no tio balta….

  5. Régulo Franquine Ferrari disse:

    Adamo
    Ótima materia!
    Um pequeno esclarecimento, apenas: quem comprou a Eliziário foi a Nicola, pois a aquisição das ações do Sr. Eliziário Goulart da Silva se concretizou em 01/06/1970 e a razão social foi alterada de Carrocerias Nicola S/A para Marcopolo S.A. Carrocerias e Ônibus somente em 1971.
    Porisso o anúncio é assinado como Marcopolo – Carrocerias Nicola S/A.
    Marcopolo era uma marca, apenas, e não a razão social.

  6. Benedito Peixoto disse:

    Quando pela primeira vez vi um ônibus nicola ano 70 com a porta dianteira bem na frente fiquei impresionado pela beleza e ousadia do projeto da carroceria ,na plaqueta estava escrito .
    CARROCERIA ELISIARIO
    NICOLA URBANO

  7. João Antonio Pinto de Carvalho disse:

    O que aconteceu com a negociação da Marcopolo e a Eliziário, aconteceu nos anos 60 quando a Volkswagen comprou a DKV para fechá-la e tirar do mercado a mais incomoda concorrente.

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